A solenidade de nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo,
é a festa de encerramento do ano litúrgico.
Há nos evangelhos um único texto em que Jesus assume o
título de rei: “O sumo sacerdote o interrogou de novo: ‘És tu o Messias, o
Filho do Deus Bendito?’ Jesus respondeu: ‘Eu sou’” (Mc 14,61-62). De resto,
Jesus rejeita para si o título de rei que pudesse identificá-lo com a esperança
de restaurar a monarquia davídica e a libertação do país da dominação
estrangeira. Jesus rejeita todos os títulos que poderiam fazer pensar no desejo
de poder (Mc 1,25.34.44; 3,12; 5,43; 7,36; 8,26.30). O poder observado no mundo
não é o vivido por Jesus e proposto aos seus discípulos: “Para vós, não será
assim” (ver: Lc 22,24-27). Jesus se distancia de toda forma de poder e
distingue a concepção de poder da comunidade dos discípulos com a comum dos
“grandes deste mundo”. O que deve ser buscado por toda a Igreja é a prioridade
do serviço: “O maior é aquele que serve” (Lc 22,27). Perguntado por Pilatos:
“Tu és o rei dos judeus?” (Jo 18,33), Jesus responde: “Meu reino não é deste
mundo” (Jo 18,36). A única realeza que Jesus aceita é a da cruz. Os evangelhos
recordarão, então, a inscrição sobre a cruz: “Jesus de Nazaré, rei dos judeus”
(Mt 27,37; Mc 15,26; Lc 23,38; Jo 19,19-22). A partir da cruz, sobre o título
de rei, não paira nenhuma ambigüidade, pois a realeza de Jesus é o serviço até
a entrega radical da própria vida, como ato de amor supremo. Jesus, Rei do
universo, inaugura um modo de vida que não admite o gosto do poder, tal qual
“as nações” o compreendem.
As três interpelações dos que zombavam de Jesus (vv.
35.37.39) lembram as interpelações do relato das tentações (cf. Lc 4,1-13).
Isto pode nos fazer compreender que a cruz do Senhor é o lugar da tentação
suprema que ele vence: “Pai, em tuas mãos eu entrego o meu espírito” (23,46).
No relato das tentações como na paixão, a tentação é a mesma: usar o poder em
benefício próprio, usar da condição de Filho de Deus e de Messias para si
mesmo. O silêncio do Senhor sobre a cruz ante as interpelações e zombarias é
expressão de sua rejeição de todo poder mundano que o desviasse de realizar a
vontade do Pai. A cruz é o lugar em que se exerce a realeza tipicamente
jesuânica: o poder de salvar, de dar a vida. À súplica do malfeitor: “...
lembra-te de mim, quando começares a reinar” (v. 42), Jesus responde: “... hoje
estarás comigo no Paraíso” (v. 43; cf. Lc 4,21).
Carlos Alberto Contieri, sj
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