domingo, 30 de março de 2014

Misericórdia que liberta – 01.04.2014

O texto do evangelho é o relato do terceiro de uma série de sete sinais realizados por Jesus, segundo o evangelho de João. Tudo está centrado na iniciativa de Jesus. Se o relato localiza o episódio em Jerusalém e, especificamente, junto à piscina de Bezata (= casa da misericórdia), em que se depositava grande expectativa terapêutica, o autor não lhe confere nenhuma importância, mas focaliza a pessoa de Jesus. O longo período de duração da enfermidade contrasta com a cura mediante a palavra eficaz de Jesus. Para aquele enfermo, cuja doença, fruto do pecado, o leitor não é informado, o tempo da espera acabou, pois é por meio de Jesus e não das águas borbulhantes da piscina que ele é liberto do pecado e da enfermidade. O relato tem um tom de controvérsia, pois a cura é feita em dia de sábado. Interpelado pelos judeus, o homem curado menciona a palavra eficaz do Senhor que não somente é superior ao sábado, mas realiza plenamente o descanso sabático pela prática da misericórdia que liberta. No entanto, o apego a um modo de pôr em prática a lei impedirá os judeus de reconheceram naquela palavra de Jesus o sinal que conduz a Deus.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

sábado, 29 de março de 2014

Confiança na palavra de Jesus. – 31.03.2014

Trata-se aqui, depois das bodas de Caná, do segundo sinal (v. 54). O sinal não é evidente por si mesmo, uma vez que ele aponta para outra realidade. Do ponto de vista do evangelho, o sinal exige discernimento e o salto da fé. Se o que Jesus realiza é visto como sinal, então, ele conduz à fé (cf. Jo 2,11; 4,53b; 20,30-31). Jesus é apresentado como Aquele cuja palavra faz viver. Sua palavra é eficaz, realiza o que diz, assim como a Palavra de Deus no primeiro relato da criação, em que todo o universo conhece a existência pela palavra criadora e eficaz de Deus (Gn 1,1–2,4a). Não há nenhum gesto feito por Jesus. Há uma palavra dita, palavra de Jesus que o funcionário do rei acreditou. Por essa palavra, o funcionário e todos os de sua casa puderam ver irromper um tempo novo em que a vida é transfigurada. A confiança na palavra do Senhor permite viver e constatar que para Deus nada é impossível. Para o leitor deste relato há um convite à confiança na palavra eficaz de Jesus. Essa confiança é um caminho que permite experimentar e conhecer a vida como dom de Deus.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

sexta-feira, 28 de março de 2014

A fé batismal é iluminação – 30.03.2014

Este texto do evangelho de João pode ser caracterizado como uma catequese sobre a fé, num contexto batismal. Temática, aliás, muito apropriada para o tempo da Quaresma, pois, além de ser um itinerário penitencial, esse tempo de preparação para a Páscoa do Senhor é um convite a aprofundarmos a nossa vocação cristã a partir do Batismo. O texto, grosso modo, é a afirmação de que a fé que recebemos é iluminação. É pela fé que chegamos a contemplar e professar a verdadeira identidade de Jesus de Nazaré.
É preciso, antes de tudo, ter presente essa afirmação que está no centro do trecho do livro de Samuel: o Senhor não vê a aparência, mas o que está no coração (cf. 1Sm 16,7). O Senhor não julga à maneira dos homens. Deus não se deixa levar pela aparência. No contexto da Quaresma, e para além dela, somos convidados a desejar ver para além das aparências, e considerar o coração, o que a pessoa efetivamente é. Aí não há engano. O que transforma o nosso olhar e faz com que seja semelhante ao olhar de Deus sobre cada pessoa é a fé, que é iluminação.
No centro do evangelho de hoje está a afirmação de Jesus: “Enquanto eu estou no mundo eu sou a Luz do mundo” (v. 5). O que interessa nesse relato do cego de nascença não é propriamente a sua cura, palavra, aliás, que não figura no texto, mas o seu itinerário de fé, itinerário ao fim do qual ele chega a professar que Jesus é o Senhor (v. 38). Quando foi expulso da sinagoga, imagem dos cristãos expulsos da sinagoga, era a fé em Jesus que o sustentava. O seu itinerário é um caminho de amadurecimento da fé, que o permitiu professar a fé ao modo de Tomé no final desse mesmo quarto evangelho (Jo 20,28). Tomé passa da dúvida e da tentação de querer chegar à fé por si mesmo a uma adesão incondicional à pessoa de Jesus Cristo. O Senhor professado pelo que antes era cego não é alguém distante, mas uma pessoa que fala com ele, que entra em diálogo com ele (cf. Jo 9,35-38), aquele que lhe abriu os olhos. A mesma luz que faz o cego ver, cega os que pensam ver. É Deus, e somente Ele, que faz com que a luz brilhe nas trevas. Que o Senhor nos conceda sempre a luz da fé e, por ela, mantenha acesa em nós a chama da esperança. Que Deus nos dê a todos a graça da coragem, da audácia, do testemunho que brota e é exigido da fé em Jesus Cristo.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quinta-feira, 27 de março de 2014

Duas atitudes do homem diante de Deus. – 29.03.2014

Os destinatários da parábola são apresentados logo no primeiro versículo do evangelho de hoje: aqueles que fechados sobre si mesmos, sobre suas próprias obras, consideram os outros como inferiores e, por isso, se enganam na sua relação com Deus. A parábola apresenta duas atitudes do homem diante de Deus. O fariseu, embora reconheça que o cumprimento da Lei é dom, se apresenta soberbo e auto-suficiente diante de Deus. Para ele a salvação é merecimento em razão de suas próprias obras, e não dom de Deus que deve ser acolhido. A consequência dessa atitude é o juízo condenatório e o desprezo pelos outros. O publicano, ao contrário, se apresenta diante de Deus humilde, consciente de sua falta, necessitado da misericórdia do Senhor. Há uma prática religiosa que, voltada para si mesma ou para a pessoa que a pratica, se transforma em pura vaidade e sutilmente rejeita um Salvador, pois o que ele pratica é, para ele, a sua justificação. A salvação é dom de Deus. O que nós fazemos deve ser a expressão da gratidão e da consciência do dom recebido.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quarta-feira, 26 de março de 2014

O amor na origem de tudo – 28.03.2014

O evangelho deste dia é um entre outros diálogos didáticos que se encontram na segunda parte do evangelho segundo Marcos. A finalidade desses diálogos é instruir os discípulos e apresentar o específico da vida cristã. O que talvez para nós, hoje, seja óbvio, não o era para os contemporâneos de Jesus, como também para os seus próprios discípulos. Ante um universo de 613 preceitos que deveriam ser cumpridos de maneira irrepreensível, qual a hierarquia entre eles, e qual teria precedência sobre outros? Qual é aquele mandamento que está na origem de todos os demais? A questão apresentada pelo escriba é pertinente e ajuda a esclarecer os discípulos. O amor está na origem de tudo: da criação e da Lei dada por Deus a Israel. Sem a referência a essa origem a lei passa a ser um fardo difícil de carregar e que leva à morte. A resposta de Jesus é clara: o amor a Deus que exige o amor ao próximo. A exigência do amor não pode figurar simplesmente como um entre outros mandamentos, pois ele é o fundamento da Lei. Para os cristãos, o amor é a expressão máxima da vida cristã (cf. 1Cor 13,1ss).


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quarta-feira, 19 de março de 2014

Jesus vai semeando a vida. – 27.03.2014

Enquanto sobe para Jerusalém, Jesus vai semeando a vida, não obstante a resistência de seus opositores. O leitor do evangelho está mais bem informado que os que fazem oposição a Jesus, pois ele sabe que Jesus foi revestido do Espírito Santo (cf. 3,21-22; 4,1.18). Por isso, causa estranheza quando aqueles anônimos fazem a afirmação contrária. O mal que enigmaticamente age no ser humano distorce a palavra e torna difícil a comunicação. Um exemplo disso é o relato da torre de babel (Gn 11,1-9). Efetivamente, o mal confunde, impede de falar bem e de bem falar. A palavra é dada ao homem para a sua comunicação com seu Criador e com os seus semelhantes. A palavra adquire seu pleno sentido no bem dizer. O mal interrompe essa comunicação. Jesus restabelece pela sua presença tal intercâmbio. Na segunda parte de sua obra, Lucas diz que é o Espírito Santo quem faz falar as maravilhas de Deus (At 2,1-11) e dá à palavra seu verdadeiro sentido. Considerar que é por Beelzebu que Jesus expulsa os demônios é um juízo equivocado, falta de discernimento. É confundir o Espírito Santo com Beelzebu. Eis aí o verdadeiro mal!


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

A Lei é pensada a partir de Jesus Cristo – 26.03.2014

Durante a sua vida terrestre, Jesus enfrentou a oposição de adversários que pensavam que o modo como ele interpretava e punha em prática a Lei e relia a Escritura era um sinal de que sua determinação era de abolir a Palavra de Deus. No embate apologético com o judaísmo rabínico, essa dificuldade se prolongou no cristianismo primitivo. O trecho do evangelho de hoje visa dirimir o equívoco (cf. v. 17). Em Jesus, toda a Escritura encontra a sua realização e no Ressuscitado, a sua luz e o seu sentido pleno. Para o cristão que lê essas linhas do evangelho é dado um critério de interpretação do Antigo Testamento: é a partir de Jesus Cristo que a lei e os profetas devem ser lidos, pois apontam para Ele. Para o cristão, a Lei é pensada a partir da cristologia. A centralidade de Jesus Cristo faz com que a exigência primordial do amor e da misericórdia se imponham como condição de autenticidade ou não de determinada prática da Lei. O que tem precedência sobre quaisquer outras prescrições legais é o mandamento do amor (cf. Lc 10,25-37).


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – Paulinas

A inciativa de Deus conta com o consentimento livre de Maria. - 25.03.2014

Ainda que figure nas primeiras páginas do evangelho segundo Lucas, os relatos da infância, dos quais nosso texto do evangelho de hoje é parte, foram os últimos escritos do evangelho. Eles são frutos da compreensão e aprofundamento da fé e, por isso, de uma teologia mais elaborada. O anúncio do anjo a Maria e o diálogo entre eles visa enfatizar a iniciativa de Deus na encarnação do Verbo. A iniciativa de Deus, no entanto, quis contar com o consentimento livre da jovem Maria, que é apresentada como “a que recebeu o favor de Deus”. O favor, ou a graça de Deus a Maria, consiste no fato da eleição dela para ser, segundo a carne, a mãe do Filho único de Deus. Nem a esterilidade de Isabel nem a pouca idade de Maria são obstáculos para que Deus realize o seu plano de amor em favor de toda a humanidade. A fé não se faz de certezas, mas em meio a dúvidas e, apesar delas, na confiança inabalável na Palavra de Deus. Maria é apresentada como aquela que escuta, confia e se engaja plenamente na realização da vontade de Deus. Nisso ela é modelo do discípulo e da Igreja.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

Vocação do profeta – 24.03.2014

O evangelho de hoje é parte do discurso programático de Jesus (Lc 4,16-30), na sinagoga de Nazaré. Trata-se da resposta de Jesus à incredulidade e resistência dos seus concidadãos. A evocação dos episódios dos profetas Elias e Eliseu permite estabelecer um paralelo entre Israel e Nazaré. Nazaré passa a ser protótipo da rejeição de Jesus por parte de todo Israel. Uma das temáticas dominantes de toda a primeira parte do evangelho de Lucas é a identidade de Jesus. Jesus é verdadeiro profeta num duplo sentido: é homem de Deus que recebe dele sua missão, e porque é rejeitado. A rejeição é um critério que permite verificar a autenticidade de sua vocação profética. A perseguição, a incompreensão, a vida ameaçada são alguns dos traços presentes na vida de todo verdadeiro profeta. Para se manter fiel à missão recebida de Deus, é preciso colocar-se inteiramente nas mãos do Senhor. Por isso, não há nada, nem mesmo a ameaça de morte, nem ninguém que possa impedir Jesus de prosseguir o seu caminho e realizar a vontade do Pai.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – Paulinas

Iluminada e saciada, ela se torna discípula. – 23.03.2014

Com o evangelho de hoje estamos, certamente, diante de uma das páginas mais belas do evangelho. Aquela mulher samaritana, ao redor do poço de Jacó, nasceu para a fé em Jesus Cristo, como nós na fonte batismal fomos gerados para a vida de fé, a fim de vivermos como um povo consagrado ao Senhor.
O trecho do livro do Êxodo nos recorda um momento da longa travessia do povo de Deus pelo deserto, ao longo de quarenta anos. O povo que empreendeu a travessia pôde experimentar, não obstante sua infidelidade e suas resistências, a fidelidade de Deus, sua paciência, sua generosidade, seu cuidado, sua ternura. O povo murmura porque não tem água. Nós que ouvimos o evangelho, e renascemos nas águas do Batismo, sabemos que aquela água que faltava ao povo e que lhe foi dada por Deus era a prefiguração da água dada por Jesus Cristo, uma água que mata definitivamente a sede. Sem água a vida está profundamente ameaçada. Não só a vida pessoal, mas a unidade do povo de Deus. Queriam, diz o nosso texto, apedrejar Moisés. Diante da dificuldade, duvidaram de Deus, da sua promessa e da sua fidelidade. Só põe em questão a fidelidade e a lealdade de Deus quem não é capaz de ser fiel e leal. É preciso, sustentados pelo cuidado de Deus que nos acompanha na travessia da história, lutarmos contra o medo, o desespero, a murmuração.
Era meio-dia quando do encontro de Jesus com a samaritana, ao redor do poço de Jacó, lugar de tantos encontros que transformaram a vida das pessoas. Foi lá que Jacó se apaixonou por Raquel. A observação da hora parece querer fazer o leitor compreender que, diante de Jesus, estamos em plena luz do dia. Aquele que é a “luz do mundo” ilumina também a Samaria, desprezada pelos outros judeus. O diálogo entre Jesus e aquela mulher é catequético, cuja finalidade é despertar a fé, o desejo da água que ela não podia recolher de nenhum poço; água que é dada somente pelo único Senhor da vida. Dando ouvidos a Jesus, ela poderá exprimir o desejo pela água que faz viver. O cântaro da purificação é superado pela água do Espírito Santo derramado no coração dela, lei interna da caridade. Iluminada e saciada, ela se torna discípula, testemunha de Jesus Cristo. Essa mesma água nos foi dada por ocasião do nosso Batismo.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – Paulinas

terça-feira, 18 de março de 2014

Deus é rico em amor. – 22.03.2014

Não é a primeira vez que o autor do evangelho observa que os fariseus e os escribas murmuram contra Jesus (cf. Lc 5,30). A razão é a mesma, a saber, a boa acolhida que Jesus dá aos pecadores. Depois, dos vv. 1-3 que dão o contexto e a motivação, Jesus conta uma série de três parábolas de misericórdia. O tema da alegria no céu pela conversão de um único pecador está presente nas três parábolas (vv. 7.10.23-24.31-32). A terra deve imitar o céu: se há alegria no céu pela conversão de um único pecador, deve haver também na terra. Na terceira parábola, a do “Pai misericordioso”, a alegria do Pai contrasta com a atitude de raiva e murmuração do filho mais velho. Tem-se a impressão de que a parábola identifica a atitude dos fariseus e dos escribas com a atitude do filho mais velho. A acolhida ao filho mais novo não é aceitação do que ele fez; é perdão e oferta de uma nova vida. As parábolas são resposta de Jesus à murmuração dos seus opositores. Mas do leitor do evangelho é exigido imitar a atitude do Pai que procura incansavelmente quem está perdido e acolhe no seu amor quem se desgarrou e foi encontrado. Deus é rico em amor, amemo-nos uns aos outros como o Senhor nos amou.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

Forte apelo a reconhecer em Jesus o dom de Deus. – 21.03.2014

A parábola não é o retrato fiel da realidade. Ela visa transmitir uma mensagem cuja finalidade é levar a compreender o mistério de Deus e adequar o comportamento do homem de fé com o desígnio salvífico de Deus. No Antigo Testamento, a vinha é símbolo do povo de Deus, povo que Deus criou e escolheu e que cuida com amor (cf. Is 5,1-7). Entre os membros do povo de Deus, há aqueles que Deus escolheu para, em nome do Senhor, cuidarem e protegerem o povo que a Deus pertence. A parábola denuncia, em primeiro lugar, aqueles que, ao invés de cuidarem do povo, querem se apossar da vinha do Senhor. Para isso, rejeitaram todos os que foram enviados por Deus para alertá-los. É uma menção ao fim trágico de muitos profetas. Em segundo lugar, e essa é a intenção mais importante da parábola, faz o leitor compreender que a morte de Jesus foi premeditada e é fruto da ganância, da maldade deliberada (cf. vv. 38-39). Apesar do v. 42, a parábola não possui um juízo condenatório; ela é, isso sim, um forte apelo a reconhecer em Jesus o dom de Deus, a viver em conformidade com esse dom e, nele, produzir bons frutos.


Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

A Lei e os profetas são dados para esta vida ... – 20.03.2014

O risco dos contemporâneos de Jesus, que continua sendo o nosso, é viver a vida como se Deus não existisse e o Senhor não nos tivesse dado o mandamento do amor ao próximo. A riqueza pode cegar e a indiferença diante do sofrimento do outro revela o abandono do mandamento de Deus, para além das aparências. Só da região dos mortos, onde a situação do ser humano é irreversível, é que aquele rico anônimo compreende que a obediência à Lei é o meio de entrar no Reino de Deus. Pela fala de Abraão, todos os discípulos e com eles o leitor do evangelho é alertado de que o meio para entrar no Reino de Deus está na meditação da Escritura, a quem se deve dar ouvidos. Se esse meio é rejeitado, não há nada que poderá demover quem quer que seja de sua má conduta. A todos nós Deus oferece os meios para viver a vida de Deus. Esses meios estão consignados na Palavra de Deus, que é uma luz para o nosso modo de proceder. A Lei e os profetas são dados para esta vida em vista do Reino de Deus.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

Era um homem justo – 19.03.2014

Celebramos, hoje, a festa de São José. O Novo Testamento reserva a ele somente umas poucas linhas. Dele se diz, fundamentalmente, que era um homem justo. Na linguagem bíblica “justo” é aquele que vive em conformidade com a Lei do Senhor. Mateus, sobretudo, esclarece que ele fez “tudo conforme o anjo lhe havia dito” (Mt 1,24; 2,13-14.19-23). O pouco que dele se diz, no entanto, é suficiente para reconhecer a razão de sua eleição de ser o pai do Filho de Deus segundo a carne, a saber, sua fidelidade a Deus, sua docilidade em se deixar conduzir pelo desígnio de Deus. O evangelho escolhido para este dia é a transição entre a infância e a idade adulta de Jesus. É a idade da maturidade da fé, 12 anos, em que Jesus, assim como todos os meninos da sua idade, se tornam “filhos do preceito”. Sua permanência no Templo e o diálogo entre ele e seus pais servem, nesse momento importante de sua vida de fé, para afirmar a que sua vida está referida e quem a move, de fato. A vida de Jesus, desde a sua origem, está enraizada no Pai; toda a sua vida se destina a realizar a vontade de Deus. Se por ora seus pais, segundo a carne, não compreendem, é porque eles têm de percorrer o caminho do seu Filho, para que à luz da ressurreição possam compreender a verdadeira identidade e missão daquele que geraram.


Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

sexta-feira, 14 de março de 2014

A vida cristã é um serviço. – 18.03.2014

Todo o capítulo 23 de Mateus é uma dura crítica de Jesus aos escribas e fariseus em razão da hipocrisia deles. O comportamento deles não corresponde à Lei que ensinam. Há uma distância entre o que ensinam e o que fazem. O modo como eles ensinam e fazem praticar os preceitos equivale a um fardo pesado posto sobre o ombro dos outros, fardo que eles mesmos não carregam. A religião que praticam é hipocrisia, pura encenação, expressão da vaidade que encerra o indivíduo em si mesmo; o coração deles não está no que fazem, pois buscam ser vistos pelos homens (v. 5). A hipocrisia faz com que eles busquem os seus próprios privilégios, esquecendo-se da misericórdia a que estão obrigados. Para a comunidade cristã, a hipocrisia deve ser rejeitada veementemente, e o comportamento dos escribas e fariseus não pode se constituir em norma de conduta. Dos discípulos é exigido um comportamento totalmente diferente, enraizado na própria vida e no ensinamento de Jesus. A vida cristã é um serviço.


Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

Deus é misericordioso. – 17.03.2014

Nosso texto é parte do que no evangelho segundo Lucas denomina-se “sermão da planície” (6,17-49); é a sequência do chamado dos Doze sobre a montanha, onde Jesus passou a noite inteira em oração (6,12-16). A nossa perícope é parte do trecho tematicamente dominado pelo imperativo do amor aos inimigos (vv. 27-35). A primeira parte do v. 36 equivale ao que no evangelho segundo Mateus é o imperativo à perfeição (Mt 5,48). Em primeiro lugar, é preciso compreender que o imperativo se baseia no que Deus é: misericordioso. Sua misericórdia se manifesta na sua bondade para com todos, ingratos e maus (cf. v. 35). A misericórdia de Deus se exprime na acolhida dada por Jesus aos pecadores (cf. Lc 5,29-32; 7,36-50; 15,1ss; 19,1-10). Cada um, independentemente de sua situação, pôde ou pode experimentar a misericórdia de Deus em relação a si mesmo. É com essa mesma misericórdia que se exige tratar os outros. O amor aos inimigos não é uma ideia; ele se concretiza na renúncia a julgar, isto é, condenar alguém (v. 37a-37b), na disposição permanente e renovada de perdoar (v. 37c) e de entregar-se a si mesmo (v. 38a), como o Senhor se entregou para a salvação de toda a humanidade.

Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

O que sustenta nossa fé, é a graça da ressurreição do Senhor. – 16.03.2014

A liturgia da palavra deste segundo domingo da Quaresma tem como intenção esclarecer a fé e fundar a esperança do povo de Deus. O livro do Gênesis, como o próprio nome o sugere, é o livro das origens; origem do universo com tudo o que contém e origem do povo de Deus; é o livro da origem do mal, mas também da fé no Deus único e verdadeiro. O texto de hoje do livro do Gênesis visa nos fazer compreender o dinamismo que está na origem de nossa fé. Em primeiro lugar, está a palavra que Deus dirige ao ser humano (Gn 12,1-3). No início da fé está um convite de Deus, um convite a sair, um convite à felicidade e à realização do ser humano. Felicidade e realização que estão contidas no verbo “abençoar”. Como a graça de Deus não é exclusiva, essa promessa e bênção dizem respeito a toda a humanidade (v. 3). No início de nossa fé está a palavra de Deus que convida o ser humano, guiado pela palavra do Senhor, a fazer uma migração para poder ser feliz. Para poder encontrar a felicidade e vivê-la como dom é preciso “sair” de si mesmo, de suas seguranças pessoais e se deixar conduzir por Deus.
O relato da transfiguração do Senhor é a sequência do primeiro anúncio da paixão, morte e ressurreição do Senhor e a apresentação das exigências para seguir Jesus (Mt 16,21-23.24-28). Os discípulos têm dificuldade de aceitar o messianismo apresentado por Jesus, que passa pelo sofrimento e pela morte. O caminho do discípulo, no entanto, é o mesmo do Mestre. A transfiguração é uma prolepse do mistério pascal de Jesus Cristo. Rosto brilhante como o sol, vestes brancas como a luz são expressões do modo bíblico de dizer que se trata de uma revelação de Deus. O que sustenta nossa vocação cristã, o que sustenta nossa fé, é a graça da ressurreição do Senhor. O sofrimento e a morte não são a última palavra. O Senhor, ressuscitando dos mortos, venceu o mal e a morte; glorioso, nos faz participantes de sua vitória. Esse é o conteúdo da esperança cristã. É preciso manter os ouvidos abertos e o olhar fixo no Senhor, que passou pelo sofrimento e pela morte, e ressuscitou. A experiência dos efeitos de sua ressurreição conduzem os discípulos, todos nós, a vivermos a adesão à pessoa de Jesus Cristo no cotidiano de nossa vida.


Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

Amar o inimigo é a atitude de quem se experimentou amado por Deus. – 15.03.2014

A exigência feita ao discípulo de superar a justiça dos escribas e fariseus, isto é, o modo de praticar a Lei, se explicita em seis antíteses (vv. 21-26; 27-30; 31-32; 33-37; 38-42; 43-48). Nosso texto de hoje é a sexta das antíteses. Trata-se de uma exigência primordial de toda a vida de fé e, em particular, da vida cristã: amar o semelhante, não importa quem seja nem o que ele fez. A exigência do amor ao próximo e ao inimigo é exigência da vida em Cristo. É a atitude de quem se experimentou amado por Deus, não obstante suas próprias faltas, e de quem tira para o seu relacionamento com os outros as consequências da misericórdia de Deus para com ele (ver: Mt 18,23-35). Essa é a atitude do misericordioso e do “fazedor de paz” (5,7.9), de quem sabe que o verdadeiro tesouro está em Deus e a sua recompensa nos bens futuros prometidos por Deus. O último versículo (v. 48) é a conclusão das seis antíteses. A perfeição consiste na superação do reducionismo legalista da Lei e na prática do amor fraterno que superam os laços afetivos. A perfeição de Deus consiste em que ele ama sem fazer acepção de pessoas. “Deus é amor” (1Jo 4,16).


Fonte Carlos Alberto Contieri,sj - Paulinas

quinta-feira, 13 de março de 2014

Reler a Lei com amor e misericórdia. – 14.03.2014

No início do sermão da montanha, Jesus dá como que um critério a partir do qual a releitura da Lei deve se apoiar: uma prática da Lei que supere o rigorismo legalista e se baseie no amor e na misericórdia (cf. Mt 9,13). É em Jesus que se vê realizada essa justiça maior que a dos escribas e fariseus. Não se trata da interdição de tirar a vida de alguém (cf. Ex 20,3; Dt 5,7), mas é proibido depreciar o semelhante dando a ele títulos ofensivos. Não é somente a morte física que é visada na interdição, mas toda ofensa moral. Jesus impõe ao discípulo a exigência de reconciliação. A reconciliação é anterior e condição para a oferta de um verdadeiro sacrifício; é o sacrifício que agrada a Deus. O esforço de reconciliação requerido e visado nessa antítese é uma explicitação da bem-aventurança da mansidão. “Manso” (cf. Sl 37,11), em hebraico, corresponde a “pobre”, entenda-se, pobre de espírito, isto é, aquele que reconhece e acolhe o Reino de Deus como dom.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quarta-feira, 12 de março de 2014

A regra de ouro é uma regra de solidariedade. – 13.03.2014


Uma leitura simplista do texto da liturgia da palavra de hoje induzirá o leitor a erro. Ele poderia ser levado a pensar que o que ele deseja e pede Deus lhe concederá tal e qual; ou, então, se ele pedir com fé Deus lhe dará. A mensagem do texto é bem outra. Nossa perícope, parte do longo sermão da montanha, utiliza repetidas vezes o verbo “pedir” (vv. 7.8.9.10.11). Deus sabe do que necessitamos (cf. Sl 138). Por que pedir? Em primeiro lugar, para reconhecer que tudo o que é bom procede do Pai (v. 11). Em segundo lugar, porque a súplica em favor das necessidades dos outros e as suas próprias abre a pessoa de fé para a relação filial com Deus Pai, que é a fonte de todo verdadeiro bem. A regra de ouro citada no v. 12 é não somente conclusão do trecho em questão, mas de toda a seção do Sermão da Montanha que trata da conduta a ser adotada em relação ao próximo. A regra de ouro é uma regra de solidariedade, que possibilita a convivência pacífica e respeitosa, anterior ao nosso texto e conhecida no mundo pagão. Um exemplo de aplicação prática e adaptação dessa regra encontra-se, por exemplo, em Eclo 31,14-15.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

terça-feira, 11 de março de 2014

O apelo é de não subordinar a fé em Jesus a nenhum prodígio. – 12.03.2014

Ao comentarmos os textos do primeiro domingo da Quaresma, dizíamos que as tentações de Jesus o acompanharam ao longo de toda a sua vida. O texto do evangelho de hoje corrobora com dita afirmação. Os contemporâneos de Jesus o provocam pedindo um sinal extraordinário vindo do céu. Visam subordinar a fé em Jesus e a credibilidade da sua palavra a esse sinal. Como no relato das tentações, Jesus se recusa satisfazer a essa exigência tal qual solicitada. Jesus mesmo, toda a sua vida, é um sinal que remete ao mistério de Deus. A evocação do episódio de Jonas apela à penitência, necessária para acolher o Reino de Deus que se faz presente na pessoa de Jesus (cf. Mc 1,15). É pela penitência que se alcança a purificação do coração, necessária para reconhecer que tudo o que Jesus faz e ensina é sinal. O coração livre de todo apego é condição para acolher o mistério de Deus tal qual ele se revela em Jesus Cristo. Para o discípulo, para quem o texto é escrito, trata-se de não subordinar a fé em Jesus a nenhum prodígio espetacular.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

segunda-feira, 10 de março de 2014

Como orar. - 11.03.2014

Nós já comentamos este texto, grosso modo, na Quarta-Feira de Cinzas. Naquela ocasião, afirmávamos que a consequência prática das recomendações de Jesus era a rejeição a determinada hipocrisia, em que, por contraste, Jesus apresenta a verdadeira e a falsa piedade. Isso, evidentemente, vale para o texto de hoje do evangelho. Não é a oração que está em questão, mas o modo de fazê-la. Deus conhece o coração de cada um, antes mesmo que as palavras cheguem à boca (cf. Sl 138). Diante dele a multiplicação de palavras é inútil. Ademais, essa multiplicação de palavras é expressão da pressão exercida sobre Deus para conseguir algo dele. O que Deus concede ao seu povo é fruto de seu amor e de sua bondade, e não de merecimento de quem quer que seja. A oração do Senhor é, para o discípulo, referência no modo de relacionar-se com Deus. Essa oração exprime, em primeiro lugar, a centralidade de Deus e o engajamento filial do discípulo com relação ao Pai. Em seguida, o discípulo consciente de sua condição suplica pelo que deve sustentá-lo na vida cotidiana: pão e perdão. Por fim, como o mal está presente no coração do ser humano, o cristão pede para, pela graça de Deus, ser liberto de todo mal.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – Paulinas

domingo, 9 de março de 2014

Somente o olhar penetrante do pastor, do Filho do Homem, pode conhecer a situação de cada um e o que se é de fato.

Trata-se de um discurso escatológico que, de certa forma, resume todo o evangelho, de modo especial os textos do seu contexto literário imediato, a saber, os capítulos 24 e 25. A manifestação definitiva do mistério do Reino de Deus se dá em gestos pequenos, simbólicos e significativos. Alguns desses gestos fazem parte de nossa vida cotidiana: dar de comer aos que têm fome, de beber aos que têm sede, vestir os que estão nus etc. O que é dito no texto vale não somente para os cristãos, mas para todo ser humano que vive neste mundo. É bastante provável que Ez 34,17-22 tenha servido de inspiração para esse discurso escatológico. A separação, ou juízo, é feita em razão da vida vivida na caridade ou pela indiferença diante do sofrimento e necessidade alheia. Somente o olhar penetrante do pastor, do Filho do Homem, que ultrapassa as aparências, pode com verdade conhecer a situação de cada um e o que se é de fato. Se o texto fala de condenação, é para apelar a se viver no amor que exige o serviço ao semelhante. O critério último da salvação não é a fé, mas a caridade.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas.

sábado, 8 de março de 2014

Jesus não permite que a voz do mal ressoe nele. – 09.03.2014

Os domingos do tempo da Quaresma são como que etapas que nos preparam para a celebração do mistério pascal de Jesus Cristo. O tempo da Quaresma deve ser marcado por uma dupla característica: deve ser a ocasião para recordarmos o nosso Batismo e a vocação a que somos chamados pela graça desse mesmo Batismo, e tempo para a penitência, isto é, o desejo e o consequente esforço de verdadeira e profunda conversão para que possamos tirar do mistério pascal de Jesus Cristo toda a sua riqueza.
O autor do segundo relato da criação do livro do Gênesis tem a preocupação de responder à seguinte pergunta: se tudo o que Deus criou é bom, por que existe o mal? Por que, muitas vezes, o mal domina sobre o ser humano? Em primeiro lugar, o autor afirma a bondade de Deus. Deus chama o ser humano à existência; Ele pôs o seu próprio “sopro” no ser humano (2,7b). O homem, tirado do pó, é obra do coração de Deus, do seu amor. No jardim que Deus plantou havia tudo o que o ser humano precisava para realizar-se como plenamente humano. No entanto, enigmaticamente, aparece a serpente, símbolo do mal do homem; ela aparece como uma força de sedução que distorce o mandamento de Deus e leva o ser humano a negar a sua própria condição de criatura e, portanto, a negar sua referência a Deus. É o mal que, segundo o nosso autor, coloca no coração do ser humano a suspeita com relação a Deus. O mal desumaniza na medida em que leva a negar-se a qualidade de criatura e sua referência ao Criador. O ser humano é colocado diante da alternativa pela qual deve decidir: confiar em Deus ou se deixar levar pela sedução do mal. Infelizmente, o primeiro homem se deixou envolver pela sedução do mal.
O relato das tentações de Jesus segundo Mateus é um sumário das tentações que acompanharam Jesus ao longo de toda a sua vida. Ao contrário do primeiro ser humano, Jesus não permite que a voz do mal ressoe nele. Pela apropriação da Palavra de Deus, por sua comunhão com o Pai, ele vence o mal; ele vence o mal pela confiança inabalável em Deus. As tentações de Jesus dizem respeito à sua filiação divina e à sua missão. É na sua condição de Filho de Deus e em relação ao seu messianismo que Jesus é tentado. Jesus não se prosterna diante do mal, pois sua vida está profundamente enraizada em Deus; somente a Deus ele adora. Foi por nós que Jesus venceu as tentações.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

sexta-feira, 7 de março de 2014

A missão de Jesus – 08.03.2014

“Depois disso” refere-se ao episódio da cura do paralítico e à discussão com os escribas e os fariseus sobre o perdão dos pecados (Lc 5,17-26). O banquete oferecido por Levi a Jesus pode ser considerado expressão da alegria pelo encontro com o Senhor e a despedida do publicano de sua vida passada. Os seus amigos estão presentes, entre eles um grande número de publicanos, reconhecidos pelos judeus praticantes como impuros, pecadores públicos, pessoas na casa de quem um justo não pode entrar nem assentar-se à mesa com eles, sob pena de tornar-se impuro. A mesa, a refeição são símbolos de comunhão, de acolhida e antecipação do banquete escatológico. Eis a razão da murmuração dos escribas e fariseus. Mas não há quem Jesus não acolha e quem não possa acolhê-lo. O amor de Deus, sua misericórdia, tem absoluta precedência em referência a qualquer regra, inclusive em relação às regras de pureza que excluem da comunhão com Deus e eximem do dever de socorrer o outro em suas necessidades (ver: Lc 10,25-37). É a presença do Senhor, e não outro alguém ou coisa, que purifica e santifica a todos, e integra-os na comunhão com Deus. O nosso texto é ocasião para afirmar, com clareza, a missão de Jesus (vv. 31-32; cf. Lc 19,10).


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quinta-feira, 6 de março de 2014

O verdadeiro jejum – 07.03.2014

Nosso texto é uma controvérsia entre os discípulos de João e Jesus acerca do jejum não observado pelos discípulos do Nazareno. Certamente, embora o texto não nos informe, não se trata do jejum prescrito pela Lei de Moisés. Dos fariseus, o próprio Lucas nos informa que eles jejuavam duas vezes por semana (Lc 18,12), mas dos discípulos de João não temos nenhuma notícia quanto a essa prática em todo o Novo Testamento. O único dia de jejum prescrito pela Lei de Moisés é para o dia do perdão (cf. Lv 23,26-32). Os fariseus que consideram a si mesmos como justos queriam impor a todo o povo as suas práticas ascéticas. É bastante provável que é disso que se trate. Jesus, antes de iniciar o seu ministério público, jejuou durante quarenta dias (Mt 4,2; Lc 4,2). Há, no Antigo Testamento, passagens em que um jejum puramente exterior, incapaz de transformar a vida da pessoa, é duramente criticado. Isaías e Zacarias, por exemplo, relativizam o jejum em face do amor e da misericórdia, que são exigências primordiais da Lei (Is 58,1-12; Zc 7). Jesus centra a prática do jejum na cristologia, a saber, é em relação à ausência do “noivo”, uma referência à sua morte, que o jejum deve ser praticado. Seguindo essa linha de raciocínio, a Igreja prescreve para os cristãos católicos o jejum na Sexta-Feira Santa.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

quarta-feira, 5 de março de 2014

O caminho dos discípulos não pode ser outro que o do Mestre. – 06.03.2014

Nosso texto de hoje está situado um pouco antes do início da seção central do terceiro evangelho, denominada “subida para Jerusalém”. O anúncio da paixão, morte e ressurreição tem por finalidade preparar os discípulos, como também o leitor, para entrarem no mistério pascal sem esmorecer e preveni-los contra o escândalo da paixão e morte de Jesus. Essa prolepse informa os discípulos acerca das condições do seguimento de Jesus Cristo. O caminho dos discípulos não pode ser outro que o do Mestre. Por essa razão, é preciso liberdade diante da própria vida. A decisão livre de seguir o Senhor deve ser acompanhada da atitude que caracteriza o seguimento: “Renunciar a si mesmo”. Trata-se do desafio de não permitir que seus projetos pessoais se anteponham à vontade de Deus, e exige uma atitude positiva de entregar a própria vida. A vida recebida como dom de Deus não está garantida na defesa das seguranças e privilégios pessoais, mas na disposição da própria vida em favor do “evangelho de Jesus Cristo” (cf. Mc 1,15). Nós não seremos plenamente livres enquanto persistir o medo da morte.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

terça-feira, 4 de março de 2014

A conversão não é tarefa de um tempo, mas empenho de toda a vida. – 05.03.2014

Com essa celebração de caráter penitencial, tem início o tempo da Quaresma, tempo de graça e reconciliação que nos prepara para a comemoração anual do mistério pascal de Jesus Cristo. O texto prescrito para a Quarta-Feira de Cinzas, invariável nos três ciclos litúrgicos, começa por um alerta (v. 1), cuja exigência prática para a vida do discípulo e de toda a comunidade cristã é a rejeição da hipocrisia, como se verá nas considerações das práticas tradicionais de piedade (jejum, esmola e oração), aspectos importantes da vida religiosa no tempo de Jesus, também recomendadas pela Igreja. Essas práticas não podem alimentar a vaidade de uma religião puramente exterior – hoje, diríamos midiática – e se constituir num espetáculo público. Não podem levar ao autocentramento, mas elas têm por finalidade levar as pessoas a saírem de si mesmas e voltarem-se para Deus, que vê no segredo do coração, e se disporem a servir generosamente seus semelhantes. O jejum, a caridade fraterna e a oração são a expressão do desejo de uma verdadeira conversão; a conversão não é tarefa de um tempo, mas empenho de toda a vida.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – Paulinas

segunda-feira, 3 de março de 2014

Deixar para se ter a plenitude – 04.03.2014

Em continuidade com o episódio anterior, temos a impressão de que, no trecho de hoje, a questão da vida eterna continua, agora, na observação de Pedro. Esse diálogo dá a Jesus a possibilidade de afirmar que, deixando tudo, em razão do chamado ao seu seguimento, é que se tem o cêntuplo (v. 30). Deixar para ter a plenitude. “Cem vezes mais” não é uma operação matemática; ela simboliza que no seguimento de Jesus Cristo, e para além do tempo de sua vida terrestre, tudo adquire sentido para o discípulo e tudo ocupa o seu devido lugar. A recompensa do discípulo é o chamado a seguir Jesus e o próprio seguimento, pois ele permite a graça de viver a vida do Senhor. A recompensa não é acerto de contas por algo realizado e merecido. Na vida cristã a recompensa é um dom de Deus. A vida eterna, enquanto dom, é a comunhão com o Pai e o Filho (cf. Jo 17,2-3) no Espírito Santo. Nesse sentido, ela não é um dom exclusivo para a “outra vida”, mas uma graça dada na provisoriedade do tempo para que se possa desejar essa comunhão na eternidade, onde nossa vida será plenamente transfigurada em Cristo.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj – 04.03.2014

domingo, 2 de março de 2014

De fato, Jesus é bom e ele faz bem todas as coisas – 03.03.2014

A atitude do anônimo que vai ao encontro de Jesus (cf. v. 17a) parece exprimir o seu desejo mais verdadeiro (v. 17b). De fato, Jesus é bom e ele faz bem todas as coisas. No entanto, ele não aceita para si o título de “Bom”, remetendo-o a Deus. Se a bondade pode ser experimentada no encontro com Jesus, através de suas palavras e de tudo o que ele faz, é preciso ser remetida, por meio dele, ao Pai que é a fonte de toda bondade. A absolutização de uma pessoa é um passo da idolatria. A vida eterna que ele deseja é dom e como tal deve ser recebida. Não é merecimento garantido pela prática da Lei nem por qualquer boa obra. Para receber a vida eterna como dom é preciso desapego, pois somente a prática da Lei não é suficiente (cf. vv. 20-21). Ademais, é no seguimento de Jesus Cristo que se encontra o caminho para a vida eterna (v. 21; cf. Jo 14,6). Diante da proposta de Jesus, o homem saiu pesaroso. De fato, a riqueza pode se constituir num verdadeiro obstáculo para se entrar no Reino de Deus. Por vezes a facilidade dos bens materiais pode se confundir com a vida verdadeira.


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas

sábado, 1 de março de 2014

O cristão não pode viver a sua fé na ambigüidade – 02.03.2014

No tempo do sofrimento, da perseguição, da angústia de estar longe da terra que Deus prometeu e deu aos ancestrais de Israel, o povo sente-se abandonado por seu Deus. O texto de Isaías deste domingo é resposta a esse sentimento de abandono. O sentimento do povo não corresponde à realidade de Deus e o engajamento da parte de Deus com relação à Aliança. O amor de Deus para com seu povo ultrapassa qualquer amor humano, até aquele que une a mãe ao seu filho. Deus, mesmo quando não experimentamos sensivelmente, sempre está presente e vela sobre todos nós com uma ternura inefável.
O texto do evangelho deste domingo faz parte do “sermão da montanha”. A fé em Deus implica, necessariamente, uma ética correspondente, isto é, um modo de agir e viver a existência humana que corresponda ao desígnio salvífico de Deus revelado em Jesus Cristo. O ser humano é colocado sempre, em todo tempo, diante da necessidade de decidir. No caso do cristão, em razão de seu enraizamento em Cristo, ele não pode viver a sua fé na ambiguidade, servindo a dois “senhores”, nem viver como se não cresse. A fé tem uma implicação ética e exige decisão, portanto, renúncia a tudo o que possa levar o discípulo a não assumir um comportamento condizente com as exigências da vocação cristã. Todos os bens da natureza e os que dela procedem são meios para que o ser humano possa viver em paz. A preocupação excessiva com os bens materiais se opõe à confiança devida a Deus e reivindica o lugar de Deus. O discípulo deve rejeitar tal ambiguidade e ilusão e viver a sua confiança em Deus sem deixar de usar os meios que o permita viver, assim como os seus semelhantes (cf. v. 33). É preciso fazer tudo como se tudo dependesse de nós e esperar tudo como se tudo dependesse de Deus. O apelo à confiança em Deus não é bênção ao comodismo, tampouco à passividade, mas exigência de olhar todos os aspectos da existência humana à luz dos valores do Reino de Deus. A confiança em Deus requerida do discípulo é reconhecimento de que Deus cuida de todos e de cada um particularmente. Deus conhece e vem sempre em socorro de nossa fraqueza. Confiemos no Senhor!


Fonte Carlos Alberto Contieri, sj - Paulinas