quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Tempo de Natal - sexta-feira - 02.01.2015

Tempo do Natal
02 janeiro

Lectio

Primeira leitura: 1 João 2, 22-28

Caríssimos, 22 quem é, então, o mentiroso? Quem é, senão aquele que nega que
Jesus é o Cristo? Esse é o Anticristo, aquele que nega o Pai e igualmente o Filho. 23Todo aquele que nega o Filho, fica sem o Pai; aquele que confessa o Filho, tem também o Pai.
24*Quanto a vós, procurai que em vós permaneça o que ouvistes desde o princípio. Se em vós permanecer o que desde o princípio ouvistes, também vós permanecereis no Filho e no Pai. 25*E esta é a promessa que Ele nos fez: a vida eterna.
26Escrevo-vos isto a propósito dos que procuram enganar-vos. 27Quanto a vós, a unção que dele recebestes permanece em vós, e não tendes necessidade de que ninguém vos ensine; mas, tal como a sua unção vos ensina acerca de todas as coisas e ela é verdadeira e não engana permanecei nele, de acordo com o que Ele vos ensinou.
28*E agora, filhinhos, permanecei nele, para que, quando Ele se manifestar, tenhamos plena confiança e não fiquemos cheios de vergonha, longe dele, por ocasião da sua vinda. 29*Se sabeis que Ele é justo, sabei também que todo aquele que pratica a justiça nasceu dele.

Em finais do século I, a Igreja viveu uma fase de grandes tribulações: os “anticristos” negavam que Jesus fosse o Messias, o Filho de Deus. A mentalidade gnóstica não podia admitir que o Verbo tivesse verdadeiramente incarnado. Mas negar essas verdades era, para João, excluir-se da comunhão com Deus e da vida. Era ser “anticristo”.
O verdadeiro cristão deve permanecer fiel à Palavra escutada desde o princípio, isto é, ao mistério pascal na sua totalidade (morte e ressurreição) ensinado pelos apóstolos. É essa a fé que permite estar em comunhão com o Filho e com o Pai (v. 24). Viver em comunhão com Deus é possuir a promessa da «vida eterna» feita por Cristo (v. 25). O crente recebeu a «unção» do Espírito no Baptismo (v. 27). Por isso pode resistir às falsidades dos “anticristos”, viver o Evangelho e aguardar a vinda de Cristo. O Espírito dá-nos a força interior da sabedoria, torna-nos discípulos invencíveis e dá-nos confiança em relação ao dia do Senhor (v. 28).

Evangelho: João 1, 19-28

19Este foi o testemunho de João, quando as autoridades judaicas lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para lhe perguntarem: «Tu quem és?» 20Então ele confessou a verdade e não a negou, afirmando: «Eu não sou o Messias.» 21E perguntaram-lhe: «Quem és, então? És tu Elias?» Ele disse: «Não sou.» «És tu o profeta?» Respondeu: «Não.» 22Disseram-lhe, por fim: «Quem és tu, para podermos dar uma resposta aos que nos enviaram? Que dizes de ti mesmo?» 23*Ele declarou: «Eu sou a voz de quem grita no deserto: ‘Rectificai o caminho do Senhor’, como disse o profeta Isaías.»
24Ora, havia enviados dos fariseus, que lhe perguntaram: 25«Então por que baptizas, se tu não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?» 26João respondeu-lhes: «Eu baptizo com água, mas no meio de vós está quem vós não conheceis. 27É aquele que vem depois de mim, a quem eu não sou digno de desatar a correia das sandálias.» 28*Isto passou-se em Betânia, na margem além do Jordão, onde João estava a baptizar.
           
João Baptista, que se encontra em Betânia, além do Jordão, dá testemunho de Jesus perante a delegação enviada pelas autoridades de Jerusalém. À pergunta: «Tu quem és?», João afasta todo e qualquer mal-entendido sobre a sua pessoa e a sua missão declarando não ser o Messias esperado. Declara também não ser Elias, nem qualquer profeta, personagens aguardadas para o tempo messiânico, provocando desorientação nos seus interlocutores.
Depois apresenta-lhes a sua verdadeira identidade: «Eu sou a voz de quem grita no deserto» (v. 23) e prepara o caminho a Cristo (cf. Is 40, 3). Ele não é a luz, mas apenas uma lâmpada que arde e dá testemunho da luz verdadeira. Ele não é a Palavra incarnada, mas apenas a voz que prepara o caminho pela purificação dos pecados e a conversão do coração. Finalmente declara: «Eu baptizo com água, mas no meio de vós está quem vós não conheceis» (v. 26).
O baptismo de João é apenas um rito para dispor ao acolhimento do Messias; não é ainda o baptismo dos tempos da salvação. João aproxima a sua pessoa da de Cristo para realçar a dignidade e a grandeza de Jesus, cuja vida tem dimensões de eternidade: João não é digno de lhe desatar a correia das sandálias, de lhe prestar os mais humildes serviços… João quer suscitar a fé em Jesus nos seus ouvintes, porque só Ele é o Salvador. O Baptista é apenas o precursor, aquele que vai afrente a preparar os caminhos.

Meditatio

João convida a que permaneçamos no Filho e no Pai. A relação com o Pai e o Filho é comparada a uma «unção». A unção permeia, penetra nos tecidos, nos corpos. Assim, quem crê no Filho, possui-O e possui também o Pai, não precisando de mais nada, porque tem o Mestre interior que não mente.
Para acreditar, é preciso ser humildes como João Baptista. O homem temperado na solidão do deserto esconde-se e desaparece à sombra d´Aquele que Se apresenta ao mundo. A sua missão foi exactamente dar testemunho. João não negou a Cristo; negou a si mesmo.
Dificilmente negamos a Cristo directamente; mas podemos negá-Lo afirmando-nos a nós mesmos.
O Cristão de hoje é chamado a ser anunciador do Evangelho e da palavra de Jesus, a voz que grita com a sua vida a verdade de Cristo, apesar da pobreza e da fraqueza que experimenta em si mesmo, nas suas palavras e métodos pastorais.
O cristão é aquele que se define em função de Cristo. Dá testemunho d´Ele, preparaLhe a missão. Não procura centrar as atenções em si, mas em Cristo e no Evangelho.
A humildade é o caminho da caridade e a condição para um testemunho apostólico abençoado por Deus. Para vir até nós, Deus percorreu o caminho da humildade (cf. Fil 2, 6-11). Não temos um caminho diferente para irmos até Ele. A humildade permite-nos permanecer em Deus.
A humildade é condição para um apostolado verdadeiro, que põe Cristo no centro das atenções. Não foi sem razão que Jesus nos mandou aprender d'Ele, não a pregar ou a fazer milagres, mas a ser "mansos e humildes de coração" (Mt 11, 29). A mansidão e a humildade de coração hão-de caracterizar, de modo particular, aqueles que se intitulam Sacerdotes do Coração de Jesus, ou querem viver a espiritualidade dehoniana.


Oratio

Senhor, ensina-nos a sermos como João Baptista, verdadeiras testemunhas de Ti e do teu amor no meio dos nossos irmãos. Como João, queremos empenhar a nossa voz, as nossas forças, toda a nossa vida para que a humanidade inteira Te reconheça presente e activo no meio de nós, se decida em teu favor e tenha comunhão contigo e com o Pai.
Senhor, reforça a nossa fé em Ti, único Salvador da humanidade. Faz-nos experimentar o poder do teu Espírito, que é a nossa força e o nosso apoio no apostolado. Ensina-nos a não presumirmos das nossas forças e métodos apostólicos, sabendo que só Tu, pelo teu Espírito, podes tornar fecundo o nosso trabalho e as nossas estratégias pastorais.
Senhor, dá-nos consciência de que somos instrumentos simples e pobres nas tuas mãos, que só a tua graça torna capazes de ser úteis na construção do Reino da justiça e da paz. Amen.




Contemplatio

A igreja apresenta-nos o exemplo do Precursor, para nos preparar a receber o nosso Deus que vem curar o nosso orgulho e salvar-nos pela humildade do presépio. É efectivamente grande a humildade do Precursor e ela brilha nas respostas aos Fariseus. Ele conquistou os corações, para o devolver a Deus, com as suas austeras virtudes e a sua heróica penitência. A sua santidade lembra e ultrapassa a dos maiores profetas. O próprio Nosso Senhor haveria de proclamar a grandeza dos seus méritos e da sua missão que muito tinham pressagiado o seu nascimento. Apesar de tudo, deu a mais humilde resposta aos Fariseus que lhe vêm perguntar se é Elias ou um dos profetas. Ele centra as atenções no Salvador: «Sou a voz que clama no deserto: endireitai o caminho do Senhor» E quando insistiram, pôs-se aos pés do seu Salvador: «Aquele que deve vir depois de mim, era antes de mim e eu não sou digno de lhe desatar as correias das sandálias».
Não procura estima para si, não procura louvores, não pensa em si mesmo senão para se humilhar (Leão Dehon, OSP 2, p. 555).

Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra:
«No meio de vós está quem vós não conheceis» (Jo 1, 26)


Fonte http://www.dehonianos.org/

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus - Ano B - 01.01.2015


ANO B
SOLENIDADE DE SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
Dia Mundial da Paz


Tema da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus

Neste dia, a liturgia coloca-nos diante de evocações diversas, ainda que todas importantes.
Celebra-se, em primeiro lugar, a Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus: somos convidados a contemplar a figura de Maria, aquela mulher que, com o seu “sim” ao projeto de Deus, nos ofereceu Jesus, o nosso libertador.
Celebra-se, em segundo lugar, o Dia Mundial da Paz: em 1968, o Papa Paulo VI propôs aos homens de boa vontade que, neste dia, se rezasse pela paz no mundo.
Celebra-se, finalmente, o primeiro dia do ano civil: é o início de uma caminhada percorrida de mãos dadas com esse Deus que nos ama, que em cada dia nos cumula da sua bênção e nos oferece a vida em plenitude.
As leituras que hoje nos são propostas exploram, portanto, estas diversas coordenadas. Elas evocam esta multiplicidade de temas e de celebrações.
Na primeira leitura, sublinha-se a dimensão da presença contínua de Deus na nossa caminhada e recorda-se que a sua bênção nos proporciona a vida em plenitude.
Na segunda leitura, a liturgia evoca, outra vez, o amor de Deus, que enviou o seu Filho ao encontro dos homens para os libertar da escravidão da Lei e para os tornar seus “filhos”. É nessa situação privilegiada de “filhos” livres e amados que podemos dirigir-nos a Deus e chamar-lhe “abba” (“papá”).
O Evangelho mostra como a chegada do projeto libertador de Deus (que se tornou realidade plena no nosso mundo através de Jesus) provoca alegria e felicidade naqueles que não têm outra possibilidade de acesso à salvação: os pobres e os marginalizados. Convida-nos também a louvar a Deus pelo seu amor e a testemunhar o desígnio libertador de Deus no meio dos homens.
Maria, a mulher que proporcionou o nosso encontro com Jesus, é o modelo do crente que é sensível aos projectos de Deus, que sabe ler os seus sinais na história, que aceita acolher a proposta de Deus no coração e que colabora com Deus na concretização do projeto divino de salvação para o mundo.


LEITURA I – Num 6,22-27

Leitura do Livro dos Números

O Senhor disse a Moisés:
«Fala a Aarão e aos seus filhos e diz-lhes:
Assim abençoareis os filhos de Israel, dizendo:
‘O Senhor te abençoe e te proteja.
O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face
e te seja favorável.
O senhor volte para ti os seus olhos e te conceda a paz’.
Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel
e Eu os abençoarei».

AMBIENTE

O nosso texto situa-nos no Sinai, frente à montanha onde se celebrou a aliança entre Deus e o seu Povo… No contexto das últimas instruções de Jahwéh a Moisés, antes de Israel levantar o acampamento e iniciar a caminhada em direcção à Terra Prometida, é apresentada uma fórmula de bênção, que os “filhos de Aarão” (sacerdotes) deviam pronunciar sobre a comunidade.
Provavelmente, trata-se de uma fórmula litúrgica utilizada no Templo de Jerusalém para abençoar a comunidade, no final das celebrações litúrgicas, antes de o Povo regressar a suas casas… Essa bênção é aqui apresentada como um dom de Deus, no Sinai.
A “bênção” (“beraka”) é concebida, no universo dos povos semitas, como uma comunicação de vida, real e eficaz, que atinge o “abençoado” e que lhe transmite vigor, força, êxito, felicidade. É um dom que, uma vez pronunciado, não pode ser retirado nem anulado. Aqui, essa comunicação de vida – fruto da generosidade e do amor de Deus – derrama-se sobre os membros da comunidade por intermédio dos sacerdotes (no Antigo Testamento, os intermediários entre o mundo de Jahwéh e a comunidade israelita).

MENSAGEM

Esta “bênção” apresenta-se numa tríplice fórmula, sempre em crescendo (no texto hebraico, a primeira afirmação tem três palavras; a segunda, cinco; a terceira, sete). Em cada uma das fórmulas, é pronunciado o nome de Jahwéh… Ora, pronunciar três vezes o nome do Deus da aliança é dar uma nova atualidade à aliança, às suas promessas e às suas exigências; é lembrar aos israelitas que é do Deus da aliança que recebem a vida nas suas múltiplas manifestações e que tudo é um dom de Deus.
A cada uma das invocações, correspondem dois pedidos de bênção: “que Jahwéh te abençoe (isto é, que te comunique a sua vida) e te proteja”; “que Jahwéh faça brilhar sobre ti a sua face (hebraísmo que se pode traduzir como ‘que te mostre um rosto sorridente e favorável’) e te conceda a sua graça”; que Jahwéh dirija para ti o seu olhar (hebraísmo que significa ‘olhar para ti com benevolência’, ‘acolher-te’) e te conceda a paz” (em hebraico: ‘shalom’ – no sentido de bem-estar, harmonia, felicidade plena).
Este texto lembra ao israelita que tudo é um dom do amor de Jahwéh e que o Deus da aliança está ao lado do seu Povo em cada dia do ano, oferecendo-lhe a vida plena e a felicidade em abundância.

ATUALIZAÇÃO

A reflexão pode fazer-se a partir dos seguintes dados:

• Em primeiro lugar, somos convidados a tomar consciência da generosidade do nosso Deus, que nunca nos abandona, mas que continua a sua tarefa criadora derramando sobre nós, continuamente, a vida em plenitude.

• É de Deus que tudo recebemos: vida, saúde, força, amor e aquelas mil e uma pequeninas coisas que enchem a nossa vida e que nos dão instantes plenos. Tendo consciência dessa presença contínua de Deus ao nosso lado, do seu amor e do seu cuidado, somos gratos por isso? No nosso diálogo com Ele, sentimos a necessidade de O louvar e de Lhe agradecer por tudo o que Ele nos oferece? Agradecemos todos os dons que Ele derramou sobre nós no ano que acaba de terminar?

• É preciso ter consciência de que a “bênção” de Deus não cai do céu como uma chuva mágica que nos molha, quer queiramos, quer não (magia e Deus não combinam); mas a vida de Deus, derramada sobre nós continuamente, tem de ser acolhida com amor e gratidão e, depois, transformada em gestos concretos de amor e de paz. É preciso que o nosso coração diga “sim”, para que a vida de Deus nos atinja e nos transforme.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 66 (67)

Refrão: Deus Se compadeça de nós
e nos dê a sua bênção.

Deus Se compadeça de nós e nos dê a sua bênção,
resplandeça sobre nós a luz do seu rosto.
Na terra se conhecerão os seus caminhos
e entre os povos a sua salvação.

Alegrem-se e exultem as nações,
porque julgais os povos com justiça
e governais as nações sobre a terra.

Os povos Vos louvem, ó Deus,
todos os povos Vos louvem.
Deus nos dê a sua bênção
e chegue o seu temor aos confins da terra.


LEITURA II – Gal 4,4-7

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas

Irmãos:
Quando chegou a plenitude dos tempos,
Deus enviou o seu Filho,
nascido de uma mulher e sujeito à Lei,
para resgatar os que estavam sujeitos à Lei
e nos tornar seus filhos adotivos.
E porque sois filhos,
Deus enviou aos nossos corações
o Espírito de seu Filho, que clama:
«Abba! Pai!»
Assim, já não és escravo, mas filho.
E, se és filho, também és herdeiro, por graça de Deus.

AMBIENTE

Entre as comunidades cristãs do norte da Galácia manifestou-se, pelos anos 55/56, uma grave crise… À região gálata chegaram pregadores cristãos de origem judaica, que punham em causa a validade e a legitimidade do Evangelho anunciado por Paulo. Este era acusado de pregar um Evangelho mutilado, distante do Evangelho pregado pelos apóstolos de Jerusalém… Para estes pregadores (“judaizantes”), a fé em Cristo devia ser complementada pelo cumprimento rigoroso da Lei de Moisés, nomeadamente pelo rito da circuncisão.
Paulo foi avisado da situação quando estava em Éfeso. Não o preocupava que a sua pessoa fosse posta em causa; preocupava-o o dano que este tipo de discurso podia trazer às comunidades cristãs… Paulo estava convencido que o movimento religioso iniciado por Jesus de Nazaré, não era uma religião formalista e ritual, uma religião de práticas exteriores, como o judaísmo farisaico do seu tempo, que se preocupava com questões formais e secundárias; além disso, estava convencido de que a salvação não tinha a ver com conquistas humanas (como se a salvação fosse conseguida à custa dos atos heroicos do homem), mas era um dom de Deus.
Alarmado pela gravidade da situação, Paulo escreveu aos gálatas. Com alguma dureza (justificada pela gravidade do problema), Paulo diz aos gálatas que o cristianismo é liberdade e que a ação de Cristo libertou os homens da escravidão da Lei… Os gálatas devem, portanto, fazer a sua escolha: pela escravidão, ou pela liberdade; no entanto – não deixa de observar Paulo – é uma estupidez ter experimentado a liberdade e querer voltar à escravidão…
No texto que nos é proposto, Paulo recorda aos gálatas a incarnação de Cristo e o objectivo da sua vinda ao mundo: fazer dos que a Ele aderem “filhos de Deus” livres.

MENSAGEM

Paulo recorda aqui aos gálatas algo de fundamental: Cristo veio a este mundo para libertá-los, definitivamente, do jugo da Lei; a consequência da ação redentora de Cristo é que os homens deixaram de ser escravos e passaram a ser “filhos” que partilham a vida de Deus.
A palavra-chave é, aqui, a palavra “filho”, aplicada tanto a Cristo como aos cristãos. Cristo, o “Filho”, foi enviado ao mundo pelo Pai com uma missão concreta: libertar os homens de uma religião de ritos estéreis e inúteis, que não potenciava o encontro entre Deus e os homens; e Cristo, identificando os homens com Ele, levou-os a um novo tipo de relacionamento com Deus e fê-los “filhos” de Deus. Por ação de Cristo, os homens deixaram de ser escravos (que cumprem obrigatoriamente regras e leis) e passaram a relacionar-se com Deus como “filhos” livres e amados, herdeiros com Cristo da vida eterna. Depois desta “promoção”, fará algum sentido querer voltar a ser escravo da religião das leis e dos ritos?
A nova situação dos homens dá-lhes o direito de chamar a Deus “abba” (“papá”). Paulo utiliza esta palavra aqui (bem como na Carta aos Romanos), apesar de os judeus nunca designarem Deus desta forma. Ela expressa uma relação muito próxima, muito íntima, do gênero daquela que uma criança tem com o seu pai: exprime a confiança absoluta, a entrega total, o amor sem limites. A insistência de Paulo nesta palavra deve ter a ver com o Jesus histórico: Jesus adotou-a para expressar a sua confiança filial em Deus e a sua entrega total à sua causa. Ora, é este tipo de relação que os cristãos, identificados com Cristo, são convidados a estabelecer com Deus.
Gal 4,4 é o único lugar em que Paulo se refere à mãe de Jesus (“Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher”); no entanto, Paulo não parece interessado, aqui, em falar de Nossa Senhora, mas em sublinhar a solidariedade de Cristo com o gênero humano.

ACTUALIZAÇÃO

Considerar, na reflexão, as seguintes questões:

• A experiência cristã é fundamentalmente uma experiência de encontro com um Deus que é “abba” – isto é, que é um “papá” muito próximo, com quem nos identificamos, a quem amamos, a quem nos entregamos e em quem confiamos plenamente. É esta proximidade libertadora e confiante que temos com o nosso Deus?

• A nossa experiência cristã leva-nos a sentirmo-nos “filhos” amados, ou ao cumprimento de regras e de obrigações? Na Igreja não se põe, às vezes, a ênfase em cumprir leis e ritos externos, esquecendo o essencial – a experiência de “filhos” livres e amados de Deus?

• A importante constatação de que somos “filhos” de Deus leva-nos a uma descoberta fundamental: estamos unidos a todos os outros homens – “filhos” de Deus como nós – por laços fraternos. É a mesma vida de Deus que circula em todos nós… O que é que esta constatação implica, em termos concretos? A que é que ela nos obriga? Faz algum sentido marginalizar alguém por causa da sua raça ou estatuto social? Aquilo que acontece aos outros – de bom e de mau – não nos diz respeito?


ALELUIA – Heb 1,1-2

Aleluia. Aleluia.

Muitas vezes e de muitos modos
falou Deus antigamente aos nossos pais pelos Profetas.
Nestes dias, que são os últimos,
Deus falou-nos por seu Filho.


EVANGELHO – Lc 2,16-21

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

Naquele tempo,
os pastores dirigiram-se apressadamente para Belém
e encontraram Maria, José
e o Menino deitado na manjedoura.
Quando O viram, começaram a contar
o que lhes tinham anunciado sobre aquele Menino.
E todos os que ouviam
admiravam-se do que os pastores diziam.
Maria conservava todas estas palavras,
meditando-as em seu coração.
Os pastores regressaram, glorificando e louvando a Deus
por tudo o que tinham ouvido e visto,
como lhes tinha sido anunciado.
Quando se completaram os oito dias
para o Menino ser circuncidado,
deram-Lhe o nome de Jesus,
indicado pelo Anjo,
antes de ter sido concebido no seio materno.

AMBIENTE

O texto do Evangelho de hoje é a continuação daquele que foi lido na noite de Natal: após o anúncio do “anjo do Senhor”, os pastores (destinatários desse anúncio) dirigiram-se a Belém e encontraram o menino, deitado numa manjedoura de uma gruta de animais. Mais uma vez, Lucas não está interessado em fazer a reportagem do nascimento de Jesus, ou a crônica social das “visitas” que, então, o menino de Belém recebeu; mas está, sobretudo, interessado em apresentar uma catequese que dê a entender (aos cristãos a quem o texto se destina) quem é esse menino e qual a missão de que ele foi investido por Deus. Nesta catequese fica bem claro que Jesus é o Messias libertador, enviado a trazer a paz; e há também uma reflexão sobre a resposta que Deus espera do homem.

MENSAGEM

Como pano de fundo do nosso texto está, portanto, a ideia de que, com a chegada de Jesus, atingimos o centro do tempo salvífico… Em Jesus, a proposta libertadora que Deus tinha para nos oferecer veio ao nosso encontro e materializou-se no meio dos homens; o próprio nome (“Jesus” significa “Jahwéh salva”) que foi dado ao menino por indicação do anjo que anunciou o seu nascimento aponta nesse sentido. Por outro lado, o facto de essa “boa notícia” ser dada, em primeiro lugar, aos pastores (classe marginalizada, considerada impura, pecadora e muito longe de Deus e da salvação) significa que a proposta de Jesus se destina, de forma especial, aos pobres e marginalizados, àqueles que a teologia oficial excluía e condenava. Diz-lhes que Deus os ama, que conta com eles e que os convoca para fazer parte da sua família.
Definida a questão essencial, atentemos nas atitudes dos intervenientes e na forma como eles respondem à chegada de Jesus…
Em primeiro lugar, repare-se como os pastores, depois de escutarem a “boa nova” do nascimento do libertador, se dirigem “apressadamente” ao encontro do menino. A palavra “apressadamente” sublinha a ânsia com que os pobres e os marginalizados esperam a ação libertadora de Deus em seu favor. Aqueles que vivem numa situação intolerável de sofrimento e de opressão reconhecem Jesus como o único salvador e apressam-se a ir ao seu encontro. É d’Ele e de mais ninguém que brota a libertação por que os oprimidos anseiam. A disponibilidade de coração para acolher a sua proposta é a primeira coisa que Deus pede.
Em segundo lugar, repare-se como os pastores reagem ao encontro com Jesus… Começam por glorificar e louvar a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido: é a alegria pela libertação que se converte em acção de graças ao Deus libertador. Depois, esse louvor torna-se testemunho: quem faz a experiência do encontro com Deus libertador tem obrigatoriamente de dar testemunho, a fim de que os outros homens possam participar da mesma experiência gratificante.
Finalmente, atentemos na atitude de Maria: ela “conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração”. É a atitude de quem é capaz de abismar-se com as ações do Deus libertador, com o amor que Ele manifesta nos seus gestos em favor dos homens. “Observar”, “conservar” e “meditar” significa ter a sensibilidade para entender os sinais de Deus e ter a sabedoria da fé para saber lê-los à luz do plano de Deus. É precisamente isso que faziam os profetas.
A atitude meditativa de Maria, que interioriza e aprofunda os acontecimentos, complementa a atitude “missionária” dos pastores, que proclamam a ação salvadora de Deus, manifestada no nascimento de Jesus. Estas duas atitudes definem duas coordenadas essenciais daquilo que deve ser a existência do crente.

ATUALIZAÇÃO

A reflexão pode partir dos seguintes elementos:

• No Evangelho que nos é, hoje, proposto, fica claro o fio condutor da história da salvação: Deus ama-nos, quer a nossa plena felicidade e, por isso, tem um projeto de salvação para levar-nos a superar a nossa fragilidade e debilidade; e esse projeto foi-nos apresentado na pessoa, nas palavras e nos gestos de Jesus. Temos consciência de que a verdadeira libertação está na proposta que Deus nos apresentou em Jesus e não nas ideologias, ou no poder do dinheiro, ou na posição que ocupamos na escala social? Porque é que tantos dos nossos irmãos vivem afogados no desespero e na frustração? Porque é que tanta gente procura “salvar-se” em programas de televisão que lhes dê uns minutos de fama, ou num consumismo alienante? Não será porque não fomos capazes de lhes apresentar a proposta libertadora de Jesus?

• Diante da “boa nova” da libertação, reagimos – como os pastores – com o louvor e a acção de graças? Sabemos ser gratos ao nosso Deus pelo seu amor e pelo seu empenho em nos libertar da escravidão?

• Os pastores, após terem tomado contacto com o projecto libertador de Deus, fizeram-se “testemunhas” desse projecto. Sentimos também o imperativo do testemunho? Temos consciência de que a experiência da libertação é para ser passada aos nossos irmãos que ainda a desconhecem?

• Maria “conservava todas estas palavras e meditava-as no seu coração”. Quer dizer: ela era capaz de perceber os sinais do Deus libertador no acontecer da vida. Temos, como ela, a sensibilidade de estar atentos à vida e de perceber a presença – discreta, mas significativa, actuante e transformadora – de Deus, nos acontecimentos mais ou menos banais do nosso dia a dia?


ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA A SOLENIDADE DE SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)

1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior à Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

2. PALAVRA DE VIDA.
Existe melhor cumprimento que dizer a uma mãe: “o seu filho é parecido consigo?” Maria preferia seguramente que lhe dissessem: “É parecida com o seu Filho!” Na Anunciação, ao dizer “faça-se segundo a tua Palavra”, Maria falava a língua do seu Filho que afirmará: “Eu vim para fazer a vontade de meu Pai!” Ao cantar o Magnificat, Maria rezava como o seu Filho Jesus que exclamará: “Pai, Eu te dou graças, porque escondeste estas coisas aos sábios e as revelaste aos mais pequeninos!” Pela sua atenção aos esposos de Canã, Maria levava o olhar do seu Filho Jesus às pessoas que terão necessidade de salvação. Ao pé da cruz, Maria sentia os sofrimentos do seu Filho que dava a maior prova de amor. A sua oração com os apóstolos na manhã de Pentecostes juntava-se ao dom do Espírito concedido pelo seu Filho à sua Igreja. Decididamente, Maria assemelha-se bem ao seu Filho e, assim, a Deus de quem ela é Mãe.

3. UM PONTO DE ATENÇÃO.
Desenvolver a oração universal… Visto que é o primeiro domingo do ano, fazer da oração de intercessão (a oração universal) um momento de memória. Pode-se recordar juntos os acontecimentos importantes do ano decorrido. Podem ser evocados, quer para dizer obrigado ao Senhor se foram sinais ou portadores de fraternidade, de paz, de partilha, quer para pedir perdão quando provocaram violência, ódio, injustiça, no mundo. No final desta oração, pode-se ler o texto da antiga segunda leitura (Col 3,12-19), apresentando-o como um convite feito a cada um para praticar as virtudes evangélicas.

4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…
Com Maria, aprender a contemplar e bendizer… Voltemo-nos para Maria que festejamos hoje. Maria, nosso modelo e nossa Mãe. Maria não cessou de “dizer bem”, ela era incapaz de dizer mal! Maria dizia bem, sem cessar, ela louvava Deus, ela bendizia-O no seu Magnificat. E mesmo sem compreender, Maria tinha confiança. Maria ensina-nos a contemplar e a bendizer: por ela, com ela, desejemos um ano em que saibamos contemplar a obra de Deus e bendizê-l’O.


UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel. 218540900 – Fax: 218540909
scj.lu@netcabo.pt – www.dehonianos.org

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Tempo do Natal - 7º dia da Oitava do Natal - 31.12.2014



Lectio

Primeira leitura: 1 João 2, 18-21

18*Meus filhos, estamos na última hora. Ouvistes dizer que há-de vir um Anticristo; pois bem, já apareceram muitos anticristos; por isso reconhecemos que é a última hora. 19*Eles saíram de entre nós, mas não eram dos nossos, porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido connosco; mas aconteceu assim para que ficasse claro que nenhum deles é dos nossos. 20*Vós, porém, tendes uma unção recebida do Santo e todos estais instruídos. 21Não vos escrevi por não saberdes a verdade, mas porque a sabeis, e também que da verdade não vem nenhuma mentira.

 S. João exorta a comunidade cristã à vigilância pela iminência da «última hora» da história, marcado por um violento ataque do «anticristo», símbolo de todas as forças hostis a Deus e personificadas nos heréticos. O tempo final da história não deve ser entendido em sentido cronológico mas teológico, isto, como tempo decisivo e último da vinda de Cristo, tempo de luta, de perseguição e de provação para a fé da comunidade. O agudizar das dificuldades indica que o fim está próximo. Vislumbra-se já no horizonte o perfil de um mundo novo. O sinal mais evidente vem dos heréticos que difundem a mentira. Embora tivessem pertencido à comunidade, mostram-se agora seus inimigos, ao abandonarem a Igreja e ao criar-lhe dificuldades.

É duro verificar que Deus possa permitir a Satanás encontrar instrumentos da sua acção dentro da própria comunidade eclesial. Mas, a esses instrumentos, opõem-se os verdadeiros discípulos de Jesus, aqueles que receberam «a unção do Santo» (cf. v. 20), isto é, a palavra de Cristo e o seu Espírito que, pelo baptismo, lhes ensina a verdade completa (cf. Jo 14, 26). Essa verdade refere-se a Jesus, o Verbo de Deus feito carne, como professa o Apóstolo, e não um Jesus aparentemente humano, figura de uma realidade apenas espiritual, como dizem os hereges docetas.



 Evangelho: João 1, 1-18



1*No princípio já existia o Verbo; o Verbo estava em Deus; o Verbo era Deus. 2No princípio Ele estava em Deus; 3*por Ele é que tudo começou a existir; sem Ele nada veio à existência. 4*Nele é que estava a Vida de tudo o que veio a existir. E a Vida era a Luz dos homens. 5A Luz brilhou nas trevas, mas as trevas não a receberam. 6*Apareceu um homem enviado por Deus, que se chamava João. 7Este vinha como testemunha, para dar testemunho da Luz e todos crerem por meio dele. 8Ele não era a Luz, mas vinha para dar testemunho da Luz. 9*O Verbo era a luz verdadeira, que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina. 10*Ele estava no mundo e por Ele o mundo veio à existência, mas o mundo não o reconheceu. 11*Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. 12*Mas, a quantos o receberam, aos que nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. 13*Estes não nasceram de laços de sangue, nem de um impulso da carne, nem da vontade de um homem, mas sim de Deus. 14*E o Verbo fez-se homem e veio habitar connosco. E nós contemplámos a sua glória,

Caixa de texto: Tempo do Natal 31|Dezembro
 a glória que possui como Filho Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade. 15*João deu testemunho dele ao clamar: «Este era aquele de quem eu disse: ‘O que vem depois de mim passou-me à frente, porque existia antes de mim.’» 16*Sim, todos nós participamos da sua plenitude, recebendo graças sobre graças. 17*É que a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade vieram-nos por Jesus Cristo. 18*A Deus nunca ninguém o viu. O Filho Unigénito, que é Deus e que está no seio do Pai, foi Ele quem o deu a conhecer.

 Ao contrário dos evangelhos da infância, o prólogo de S. João não narra os acontecimentos históricos do nascimento e da infância de Jesus. De forma poética, descreve a origem do Verbo na eternidade de Deus e a sua pessoa divina no amplo quadro bíblico do projecto de salvação, que Deus traz para o homem.

Começa pela preexistência do Verbo (vv. 1-5), real e em comunhão de vida com o Pai; o Verbo pode falar-nos do Pai porque possui a eternidade, a personalidade e a divindade (v. 1). Depois fala da vinda histórica do Verbo para meio dos homens (vv. 6-13), de cuja luz deu testemunho João Baptista (vv. 6-8); a luz põe o homem perante a necessidade de fazer uma opção de vida: recusá-la ou acolhê-la, permanecer na incredulidade ou aderir à fé (vv. 9-11); o acolhimento favorável tem por consequência a filiação divina, que não procede da carne ou do sangue, isto é de possibilidades humanas (vv. 12-13). Finalmente, a Incarnação do Verbo (v. 14) como ponto central do prólogo. Este Verbo já tinha entrado na história humana por meio da criação, mas agora vem habitar entre os homens de um modo activo: «O Verbo fez-se homem», na fragilidade de Jesus de Nazaré, para mostrar o amor infinito de Deus. Nele, a humanidade crente pode contemplar a glória do Senhor, a glória de Jesus, o Revelador perfeito e escatológico da Palavra que nos faz livres, o verdadeiro Mediador humano-divino entre o Pai e humanidade, o único que nos manifesta Deus e no-lo faz conhecer (vv. 17-18).



 Meditatio

 «Todos nós participamos da sua plenitude, recebendo graças sobre graças», diz-nos João no Prólogo do seu evangelho. Vamos partir desta frase para n os colocarmos numa atitude de acção de graças, neste último dia do ano. Ao longo dele, fomos recebendo cada dia graça sobre graça, cada um segundo as suas necessidades e capacidades de receber. E, as graças que recebemos este ano, preparam as que havemos de receber no ano que vai começar.

Recebemos a graça do perdão misericordioso de Deus para os nossos pecados e para termos coragem de avançar no caminho da santidade. Recebemos luz para avançarmos, dia a dia no ano que termina. Essa luz também não deixará de brilhar sobre nós no ano que começa. A luz é o próprio Filho de Deus feito homem: «Eu sou a Luz do mundo». Essa luz é-nos dada como força e como amor, sobretudo na Eucaristia. Há que acolhê-la de coração aberto e disponível para todos os dons e surpresas de Deus.

A falta dessa abertura levou alguns cristãos, logo na primitiva Igreja, à heresia. Não aceitavam que Deus se pudesse fazer homem e, mais ainda, homem pobre, homem frágil. Ao longo da história, e ainda em nossos dias, não faltam falsos profetas e mestres de falsidade, que se servem do nome de Cristo para propagar as suas ideias e doutrinas. Muitas vezes, provêm das próprias comunidades cristãs. Há que distinguir o verdadeiro do falso. A verdadeira doutrina traz alegria e paz interior.

O dom e o mistério de pertencer à Igreja têm como única garantia a fidelidade à Palavra de Cristo, em humilde e permanente busca da verdade. Recusar a Igreja é recusar a Cristo, a verdade e a vida (cf. Jo 14, 6). Recusar a Igreja é não acreditar no Evangelho e na Palavra de Jesus, é viver nas trevas, no não-sentido. O verdadeiro discípulo de Jesus é aquele que, tendo recebido a unção do Espírito Santo, se deixa conduzir suavemente pela sua acção e pela sua verdade, reconhecendo os caminhos de Deus, esperando a sua vinda sem alarmismos nem fantasias milenaristas. A Incarnação de Cristo impregnou toda a história e toda a vida dos homens, porque só nele reside a plenitude da vida e toda a aspiração de felicidade e o homem entrou de pleno direito entre os familiares de Deus.

O fim do ano civil recorda-nos que a história humana é guiada por Deus. Para Ele a nossa gratidão e a nossa súplica de vida nova que sempre nos quer oferecer.

Escreve o Pe. Dehon: «O fim do ano é imagem do fim da vida; lembra-nos esse fim. Entremos nos sentimentos de Ezequias, que vendo-se à beira da morte, se humilhava e



 deplorava as suas faltas… Mas não será também preciso dar graças a Nosso Senhor pelos benefícios que recebemos este ano? Ele suportou-nos, perdoou-nos, abençoou as nossas obras. O seu Coração abriu-se largamente a nós. Não será justo sermos reconhecidos?» (Leão Dehon, OSP 4, p. 603s.).



 Oratio

 Senhor, quero hoje rezar-te com Ângela de Foligno:

«Meu Deus, faz-me digna de conhecer o altíssimo mistério da tua ardente caridade, o mistério profundíssimo da tua Incarnação. Fizeste-te homem por nós. Desta carne começa a vida da nossa eternidade… Ó amor que todo Te dás! Aniquilaste-te a Ti mesmo, desfizeste-te a Ti, para me fazeres a mim; assumiste os farrapos de um servo vilíssimo, para me dares o manto real e a veste divina…

Por isto que entendo, que compreendo com toda mim mesma – que Tu nasceste em mim – sê bendito, ó Senhor! Ó abismo de luz! Toda a luz está em mim, se eu vejo isto, se compreendo isto: que Tu nasceste em mim. Na verdade, esta inteligência é uma meta: a meta da alegria… Ó Deus, não criado, torna-me digna de me afundar neste abismo de amor, de sustentar em mim o ardor da tua caridade. Faz-me digna de compreender a inefável caridade que nos comunicaste quando, por meio da Incarnação, nos manifestas-te Jesus Cristo como teu Filho, quando Jesus Cristo Te manifestou a nós como Pai.

Ó abismo de amor! A alma que Te contempla eleva-se admiravelmente acima da terra, eleva-se acima de si mesma e paira, pacificada, no mar da serenidade».



 Contemplatio

 S. João é o pregador do amor. Todo o seu evangelho está neste espírito. A sua primeira página é uma elevação de amor para o Verbo incarnado. «Nós vimos, diz, o Filho de Deus cheio de graça e de glória». Só ele descreve as núpcias tocantes de Caná, o colóquio com a Samaritana, a grande promessa da Eucaristia, a parábola do bom Pastor, a ressurreição de Lázaro, o lava-pés e os discursos tão ternos do Bom Mestre durante a Ceia e depois da Ceia. Narra a abertura do Coração de Jesus.

As suas epístolas pregam a caridade: «Deus é caridade… amou-nos primeiro… deu- nos o seu Filho por nosso amor. Portanto, amemo-lo também da nossa parte». E sem cessar repete: «Amemo-nos uns aos outros».

Vivendo junto de Maria e da Eucaristia, caminha para a consumação do amor. Chega à união mística mais intensa com Nosso Senhor, às visões, às revelações. O céu está aberto para ele. Descreve-o inteiramente. Mas sobretudo o Cordeiro triunfante retém o seu olhar: o Cordeiro sempre ferido no Coração e imolado, o Cordeiro que é bem o laço de amor entre Deus e nós.

Avancemos humilde e progressivamente no amor com S. João (Leão Dehon, OSP 3, p. 404s.)

 Actio

 Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

«Participamos da plenitude do Verbo; dele recebemos graças sobre graças». (Jo 1, 16).


Fonte http://www.dehonianos.org/

domingo, 28 de dezembro de 2014

Tempo do Natal - 6º dia da Oitava do Natal - 30.12.2014



Lectio

Primeira leitura: 1 João 2, 12-17

12*Eu vo-lo escrevo, filhinhos: Os vossos pecados estão-vos perdoados pelo nome de Jesus. 13*Eu vo-lo escrevo, pais: Vós conheceis aquele que existe desde o princípio. Eu vo-lo escrevo, jovens: Vós vencestes o maligno. 14Eu vo-lo escrevi, filhinhos: Vós conhecestes o Pai. Eu vo-lo escrevi, pais: vós conheceis aquele que existe desde o princípio. Eu vo-lo escrevi, jovens: Vós sois fortes, e a palavra de Deus permanece em vós, e vós vencestes o Maligno. 15*Não ameis o mundo, nem o que há no mundo. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. 16*Pois tudo o que há no mundo ..a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e o estilo de vida orgulhoso . não vem do Pai, mas sim do mundo. 17*Ora, o mundo passa e também as suas concupiscências mas quem faz a vontade de Deus permanece para sempre.

 João dirige-se afectuosamente à comunidade cristã para que seja coerente com o projecto de salvação e com as opções que fez em relação a Deus e ao mundo. Assim poderá manifestar o seu amor para com Deus.

Escrevendo aos filhos, exorta-os a reflectir sobre a situação actual de salvação em que vivem, pois obtiveram o perdão dos pecados (v. 12) e conheceram o Pai (v. 14ª). Escrevendo aos pais, recorda-lhes que conheceram Jesus, «aquele que existe desde o princípio» (v. 13), por meio da Palavra, pelo que se exige deles uma fé madura que não os deixe ser seduzidos pelo mundo. Aos jovens recorda que aderiram a Jesus e venceram o mal (v. 13), e que a sua fortaleza espiritual, reforçada pela palavra de Deus, os exclui de compromissos com as fáceis atracções do mundo (v. 14).

Este projecto de vida espiritual resume-se numa vida separada da lógica do mundo, entendido como reino do mal que se opõe a Deus. Deus e mundo são duas realidades opostas. João menciona alguns aspectos que pertencem à transitoriedade do mundo, inimigo de Deus: «a concupiscência da carne», isto é, as tendências más que existem no homem decaído e inclinado ao pecado; «a concupiscência dos olhos», isto é, a cobiça que pode entrar pelos olhos, tal como a avidez pelos bens terrenos; «o estilo de vida orgulhoso», isto é, o orgulho fundado na concepção materialista da vida.

A separação do mundo tem, para os cristãos, uma razão de ser: vivem no mundo, mas sabem que, enquanto o mundo passa, Deus permanece (v. 17).



 Evangelho: Lucas 2, 36-40

 36Quando os pais de Jesus levaram o Menino a Jerusalém, a fim de o apresentarem ao Senhor, estava no templo uma profetisa, Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser, a qual era de idade muito avançada. Depois de ter vivido casada sete anos, após o seu tempo de donzela, 37*ficou viúva até aos oitenta e quatro anos. Não se afastava do templo, participando no culto noite e dia, com jejuns e orações. 38*Aparecendo nessa mesma ocasião, pôs-se a louvar a Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a redenção de Jerusalém. 39Depois de terem cumprido tudo o que a Lei do Senhor determinava, regressaram à Galileia, à sua cidade de Nazaré. 40*Entretanto, o menino crescia e robustecia-se, enchendo-se de sabedoria, e a graça de Deus estava com Ele.

 Caixa de texto: Tempo do Natal 30|Dezembro
 O texto do evangelho que lemos hoje é a conclusão do episódio da apresentação de Jesus ao templo. Consta de duas partes: o testemunho da profetiza Ana (vv. 36-38) e o regresso da Sagrada Família a Nazaré (vv. 39-40).

De acordo com a lei dos hebreus, para garantir a verdade de um facto, exigia-se a deposição de duas testemunhas. Depois do testemunho de Simeão, vem o de Ana. É outra “pobre de Deus”, típica representante daqueles que aguardavam a redenção de Israel. Louva o Senhor porque reconheceu no Menino Jesus, apresentado ao templo, o Messias esperado, e espalhou a notícia entre aqueles que viviam disponíveis para o evento da salvação (v. 38).

A cena conclui-se com a observação de Lucas sobre o crescimento de Jesus, em Nazaré: «o menino crescia e robustecia-se, enchendo-se de sabedoria, e a graça de Deus estava com Ele» (v. 40). Diz-se muito pouco sobre a vida oculta de Jesus. Mas, o pouco que se diz, é suficiente para captarmos o espírito e apreciarmos o ambiente onde viveu o Salvador: os seus pais eram obedientes e fiéis à Lei, Jesus crescia em sabedoria, cheio como estava dos dons da graça de que o Pai o cumulava (cf. v. 52; 1 Sam 2, 26). Estamos perante uma comunidade que se abre ao reino de Deus, no respeito pela vontade do Pai.



 Meditatio

 A profetiza Ana, uma anciã com 84 anos, número bíblico que simboliza a perfeição (resulta de 12x7), pois está no fim dos seus dias, sugere uma comparação com o ano civil que também está a terminar. Ana, depois de 7 anos de casamento, permaneceu no templo, servindo a Deus dia e noite com jejuns e orações. Por isso mereceu a graça do encontro com o Salvador. O nosso ano civil também está muito velho, e termina com o encontro do Senhor no Natal. Esse encontro é tanto mais belo e frutuoso quanto tiver sido cuidada a preparação. Mas, apesar de toda a nossa infidelidade, o Senhor, na sua infinita bondade e misericórdia, vem até nós, e dá-se a conhecer como nosso Salvador. Por isso, também nós, como Ana e, afinal, como Maria e todos os que esperavam a salvação de Israel, podemos entoar hinos de louvor e gratidão ao Senhor.

Este encontro com o Senhor traz-nos a salvação, insere-nos numa nova forma de vida, com a qual havemos de ser coerentes, para manifestarmos o nosso amor a Deus. A vocação cristã, a que fomos chamados, compromete-nos a viver no mundo a serviço do homem, para testemunhar a Cristo e levar a todos a sua mensagem de salvação. Vivemos no mundo, mas sem nos confundirmos com ele, nem cedermos a compromissos com ele. Caso contrário, negamos o espírito de humildade, de pobreza, de caridade que deve animar a nossa vida de crentes. Só o coração que se esvaziar do mundo, das suas propostas de vida transitórias e da avidez pelos seus bens efémeros, podem ser cumulado do amor do Pai (cf. 1 Jo 2, 15).

O discípulo de Jesus jamais será aceite pelo mundo, por causa da sua opção de vida, contrária às propostas e interesses mundanos. Os crentes, por causa da sua eleição e da sua opção de vida por Cristo, são considerados estranhos e inimigos do mundo. Por isso é que o homem de fé é odiado e recusado. O mundo recusa os discípulos porque não são seus. Perturbam a sua paz, desmascaram o seu orgulho, acusam o seu conformismo. Mas, se Cristo permanece sinal de contradição para quem segue a lógica do amor, também é certo que tanta oposição se torna critério de autenticidade e de solidez para os discípulos de Cristo.

Como cristãos e, mais ainda, como religiosos, estamos “no mundo”, mas não somos “do mundo” (cf. Jo 17, 11-14). As nossas Constituições dizem-nos que estamos inseridos no mundo, “segundo a nossa vocação específica” (n. 61), isto é, que devemos conservar e viver a nossa identidade de oblatos, servindo o Senhor noite e dia, e servindo os homens, segundo o nosso carisma específico e a missão a que somos chamados. Se assim não for, condenamo- nos à esterilidade em relação a nós mesmos, à Igreja, ao mundo, e esvaziamos de significado a nossa missão (cf. ET 52).

A vivência da nossa vocação e missão não está livre de oposições. Sabemos quantas dificuldades o Pe. Dehon teve que enfrentar durante a sua longa vida e como elas acabaram por revelar a autenticidade e a solidez da sua santidade e do seu carisma. Escreve na meditação para o último dia do ano: «O ano teve, sem dúvida, sofrimentos e tristezas. Seria heróico agradecer a Deus essas provações que, nos seus desígnios sobre nós, têm a finalidade de nos purificar e santificar… Bendigamos a Deus e pensemos nas alegrias eternas que hão-de recompensar as provações actuais» (OSP 4, p. 604).



Oratio





Senhor Jesus, Tu quiseste viver numa família humana sem aparência, prestígio ou riqueza, a tua experiência humana. A tua vida de criança foi marcada pela fragilidade e pelo crescimento normal. Trabalhaste para ganhar o pão de cada dia. Viveste no escondimento e na reflexão silenciosa a preparação para a vida pública. Assim experimentaste a condição humana e venceste o orgulho do mundo.

Dá-nos a graça de acolhermos, com alegria e gratidão, a nossa fragilidade humana, a nossa história, a nossa família, a terra onde nascemos. Dá-nos a graça de aceitarmos a nossa fragilidade espiritual, sem todavia renunciarmos à busca permanente da tua sabedoria e da tua Palavra.

Dá-nos a graça de sermos coerentes com a opção que fizemos por Ti, no Baptismo, na profissão religiosa. Que, jamais, a pretexto de inserção no mundo, nos deixemos confundir com ele, com os seus ideais e interesses. Que, a pretexto de não-violência, jamais desçamos a compromissos com o mundo, entendido como conjunto de forças que se opõem a Ti e ao teu Reino.

Que, tendo-Te aceitado como Salvador e Senhor da nossa vida, aceitemos também partilhar um destino semelhante ao teu. Amen.



 Contemplatio

 Ana, filha de Fanuel, mulher venerável, cheia de anos e de graças, também estava lá. Tinha o costume de rezar longamente todos os dias no Templo, e esperava como Simeão a vinda do Messias.

Como Simeão, ela reconheceu o menino divino e sua mãe, e isto foi para ela a mesma alegria e a mesma acção de graças. Exultava e anunciava a boa nova a todas as pessoas piedosas que esperavam a redenção de Israel.

E eu, eu recebo Nosso Senhor na sagrada comunhão. Recebo-o mesmo mais intimamente que Simeão. Vem dar-me a sua graça. Qual é o meu fervor para o receber? Como é que lhe testemunhei até aqui a minha alegria, o meu respeito, o meu reconhecimento?

Ana, toda entusiasmada, falava de Jesus a todas as pessoas: loquebatur de illo omnibus. Quais são as minhas conversas depois das minhas comunhões? São edificantes, caridosas, sobrenaturais?

Transportado de amor depois das minhas comunhões, devia estar resolvido a viver glorificando Jesus e a morrer amando-o.

Simeão repete a Maria a profecia de Isaías: «O Cristo será para a santificação de muitos em Israel, mas será para outros uma pedra de escândalo» (Is 8,14). É manifesto. Cristo é causa de salvação e de ressurreição para aqueles que o reconhecem, que o amam e que o servem. É causa de ruína para aqueles que o rejeitam.

A indiferença não é colocada aqui. Jesus é a vida. Todas as bênçãos são prometidas àqueles que o seguem e que o amam. É preciso estar com ele ou com o mundo. Os povos e as famílias, como os particulares, encontrarão o caminho da paz e dos favores divinos no seguimento de Jesus e no seu serviço.

Estas palavras do profeta são graves. Há dois caminhos oferecidos à nossa escolha: de um lado o caminho das bênçãos, com o seu traçado marcado no Evangelho: «Bem- aventurados os pobres, bem-aventurados os puros, bem-aventurados os que choram, os que perdoam, os que sofrem perseguição». Do outro lado, o caminho que afasta de Cristo. Tem este traçado: amor pelo ouro, pelo luxo, pelo prazer e pelo mundo. – Sois vós quem eu escolhi, meu Salvador, é o vosso caminho, é o vosso amor, é o vosso Coração, mesmo que deva encontrar as contradições e as perseguições!

Simeão predisse a Maria a dor e a espada. Ela terá uma grande parte na paixão de Jesus. Sofrerá, ela também, por nós e pela nossa salvação. Ó Maria, como queria consolar-vos e partilhar das vossas mágoas para as aliviar! Até aqui, aumentei-as com as minhas faltas, perdoai-me. Vou-me esforçar por vos consolar com a minha paciência, com os meus sacrifícios e com as minhas mortificações.

Com Simeão, alegro-me por possuir muitas vezes Jesus na sagrada comunhão. Agarro-me ao bom Mestre, que é sempre contradito. Contentarei o seu divino Coração com as minhas práticas quotidianas de reparação e de amor (Leão Dehon, OSP 3, p. 127s.)

 Actio





Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

«Quem faz a vontade de Deus permanece para sempre» (1 Jo 2, 17).


Fonte http://www.dehonianos.org/

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Tempo do Natal - 3º dia da Oitava do Natal > Festa de S. João - 27.12.2014


Lectio

Primeira leitura: 1 João 1,1-4

Caríssimos: 1*0 que existia desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que contemplámos e as nossas mãos tocaram relativamente ao Verbo da Vida, 2* de facto, a Vida manifestou-se; nós vimo-Ia, dela damos testemunho e anunciamo-vos a Vida eterna que estava junto do Pai e que se manifestou a nós- 3*0 que nós vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também vós estejais em comunhão connosco. E nós estamos em comunhão com o Pai e com seu Filho, Jesus Cristo. 4*Escrevemo-vos isto para que a nossa alegria seja completa.

No breve prólogo à sua Primeira Carta, S. João expõe os critérios para entrarmos em comunhão com Deus. Oferece-nos também um itinerário de fé, e indica as defesas a usar contra o pecado.

João fundamenta a fé cristã no «Verbo da vida», de que dá testemunho, indicando, e descrevendo de modo sintético, as suas etapas essenciais. Mas, ao contrário do Prólogo do seu evangelho, onde acentua o «Verbo», aqui acentua a «vida», que Jesus possui e dá. Tudo começa com a experiência pessoal do apóstolo, no contacto com Jesus: «o que ouvimos, o que vimos, o que contemplámos e as nossas mãos tocaram relativamente ao Verbo da Vida» (v. 1). Esta experiência torna-se testemunho e exemplo coerente (v. 2), anúncio corajoso, que gera comunhão entre aqueles que o escutam e abraçam a fé, e comunhão com o próprio Pai e com o seu Filho Jesus (v. 3). Esta comunhão, por sua vez, gera a alegria do coração (v. 4).

A palavra «nós» põe-nos diante da tradição da escola joânica, que desenvolve o testemunho do discípulo amado, fundado na «vida divina» tornada visível em Jesus.



Evangelho: João 20, 2-8

2*No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo, o querido de Jesus, e disse-lhes: «O Senhor foi levado do túmulo e não sabemos onde o puseram.» 3pedro saiu com o outro discípulo e foram ao túmulo. 4Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo correu mais do que Pedro e chegou primeiro ao túmulo. 5Inc/inou¬se para observar e reparou que os panos de linho estavam espalmados no chão, mas não entrou. 6*Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no túmulo e ficou admirado ao ver os panos de linho espalmados no chão, 7* ao passo que o lenço que tivera em volta da cabeça não estava espalmado no chão juntamente com os panos de linho, mas de outro modo, enrolado noutra posição. 8Então, entrou também o outro discípulo, o que tinha chegado primeiro ao túmulo. Viu e começou a crer.

João dá-nos neste texto uma síntese dos acontecimentos verificados na manhã da Páscoa, em que são protagonistas Maria Madalena, Pedro e ele próprio. A noite espiritual em que tinham mergulhado os apóstolos está para dar lugar à experiência de fé, que começa junto ao túmulo vazio, sinal da presença do Ressuscitado (v. 2). Ao receberem a notícia de que fora retirada a pedra do sepulcro, e de que o corpo de Jesus lá não estava, Pedro e João foram verificar o que sucedera. A sua corrida revela amor e veneração, e faz pensar na Igreja que procura sinais visíveis do Senhor, especialmente quando se encontra em dificuldade e não consegue vê-lo. João chega primeiro do que Pedro ao sepulcro, devido à sua intuição amorosa de discípulo amado, mas é Pedro quem entra por primeiro, devido à sua função eclesial (vv. 5- 7). Depois de observar a ordem das várias coisas que se encontravam no sepulcro, e a paz que nele reinava, o discípulo amado abre-se à visão da fé, acreditando nos sinais visíveis do Senhor: «Viu e começou a crer» (v. 8). Ainda não é a fé plena na Ressurreição. Isso só acontecerá quando o seu espírito se abrir à inteligência das Escrituras (cf. Lc 24, 45), quando vir a pessoa do Senhor e receber o dom do Espírito Santo, isto é, quando tiver percorrido todo o itinerário da fé.

Meditatio

S. João é uma figura de fundamental importância na Igreja primitiva. De facto, é o discípulo amado que ensina a contemplar em Jesus, o Filho de Deus feito homem, para nos revelar o rosto do Pai e o caminho que leva à comunhão com Ele. Por esta razão, João é chamado teólogo. Os seus escritos levam a acreditar em Jesus Messias e Filho de Deus (cf. Jo 20, 31). O seu símbolo é a águia porque, como refere uma sentença rabínica, a águia é a única ave que consegue fixar o sol sem cegar. Para João, o sol é Cristo. A sua presença na comunidade descobre-se pela contemplação e pela inteligência da Palavra de vida. A vida, na sua realidade mais profunda, é «a Vida eterna que estava junto do Pai e que se manifestou a nós». Jamais contemplaremos suficientemente este mistério de vida que se tornou perceptível para nós em Jesus, Filho de Deus, a vida eterna que estava junto do PaiO

S. João faz-nos compreender quanta profundidade se encontra na pessoa do Filho, na sua união com o Pai, na sua comunhão com Eleffi Incarnação tem por objectivo tornar-nos participantes nessa comunhão divina: estamos «em comunhão com o Pai e com o seu Filho, Jesus Cristo». A Incarnação aconteceu em vista da comunhão. Isto é espantoso. A carne é causa de divisão! Por causa dela, estamos num lugar e não noutro. Podemos chegar até às pessoas queridas pelo pensamento. Mas a carne impede-nos estar em comunhão com elas. E quantas discussões, litígios e divisões por causa dos bens materiais! O Filho de Deus, ao assumir a nossa carne, tornou-a meio de comunhão. Tudo o que assumiu se tornou instrumento de comunhão com Deus e entre nós. Na Eucaristia, onde a carne de Cristo se põe ao serviço da comunhão, fazemos a comunhão, isto é, recebemos a comunhão com o Pai e a comunhão entre nós. Para isso, Cristo teve de sacrificar a sua carne, teve de entregá-Ia aos inimigos, para fazer dela um sacrifício agradável, um sacrifício perfeito. Então, a vida mostrou toda a sua força.

O evangelho de hoje leva-nos até à Páscoa, mostra-nos a meta alcançada: a vida venceu a morte e manifestou-se. O que João viu foi esta vitória da vida, manifestada no sepulcro pelas ligaduras, pelo sudário. O corpo de Cristo já não está no sepulcro, porque a vida triunfou. Mas Jesus incarnado está sempre connosco, porque a vitória sobre a morte foi alcançada para nós.

Uma outra lição que podemos tirar do evangelho de hoje é o respeito pelos carismas, que são muitos na Igreja, para bem da mesma Igreja. João, que tem o carisma da profecia, é respeitado Pedro, que tem o carisma da instituição. O respeito pelos carismas, e a partilha na busca comum dos dons do Espírito, permite-nos penetrar no mistério, reconhecer os sinais do Ressuscitado.

Com S. João, também nós somos chamados a "conhecer", isto é, fazer experiência de vida e a "crer", isto é, a aderir com todo o coração e com toda a nossa pessoa, "ao amor que Deus nos tem"? (1 Jo 4, 16), amor manifestado no Verbo Incarnado. Esse inefável "amor que Deus nos tem ... !", de que João é «doutor», no dizer do Pe. Dehon, é o grande mistério para todo o cristão e, em particular, para todo o oblato-SCJ.

É este mistério que queremos proclamar diante da Eucaristia, diante do Crucificado de Lado aberto, diante da nossa vocação de Oblatos-Sacerdotes do Coração de Jesus.



Oratio

Senhor Jesus Cristo, que revelaste a João, teu discípulo amado, os misteriosos segredos da Palavra, dá-nos também a nós, hoje, e a toda a Igreja, uma nova inteligência espiritual das Escrituras. Assim poderemos iluminar, cada vez mais, a nossa vida espiritual, e aprender a tua ciência sublime.

Concede à Igreja pastores sábios e santos, capazes de colher o sentido espiritual e profundo das Escrituras e introduzir o povo de Deus na tua intimidade. Assim todos poderemos conhecer o teu Coração, o teu pensamento, a profundidade do teu Espírito e o modo como conduzes a história da Igreja.

Por intercessão do teu discípulo amado, faz-nos experimentar o amor do teu Coração, e torna-nos assíduos e delicados no teu serviço. Sempre, e em toda a parte, queremos, como S. João, realizar a tua vontade sobre nós. Ajuda-nos!



Contemplatio

S. João teve com Jesus os laços mais íntimos: foi seu parente, seu discípulo, seu amigo, seu herdeiro. Tiago e João eram filhos de Salomé, parente de Maria. Eram chamados irmãos de Jesus. Era costume chamar irmãos os parentes próximos. João deve ter conhecido Jesus menino.

Ligou-se a Ele, primeiro como discípulo com Santo André (Jo 1, 37). Tendo ouvido João Baptista chamar Jesus Cordeiro de Deus, deleitou-se com esse nome, meditava-o sem cessar, e lembra-o muitas vezes no Apocalipse.

S. João está sempre junto de Jesus. Quando Jesus toma aparte alguns apóstolos, para os mais belos milagres, para a transfiguração, para a agonia, S. João está sempre.

Senta-se junto de Jesus. S. Pedro sabe bem que João é o amigo e que, por meio dele, pode conhecer os segredos que Jesus não revela a todos.

S. João pode narrar em pormenor os discursos de Jesus depois da Ceia porque os ouviu melhor que os outros.

S. João ama como é amado. Segue Jesus por todo o lado (Petrus vidit iI/um sequentem). Segui-Io-á até ao Calvário. Assiste à morte de Jesus, ao golpe misterioso da lança, à sepultura. Vê de perto o lado de Jesus aberto. Abraça-o, sem dúvida, como um dia havia de fazer S. Francisco (Haurietis aquas in gáudio).

S. João é o herdeiro de Jesus, que lhe legou a sua mãe e necessariamente com ela as habitações de Nazaré e as lembranças.

Jesus disse a Pedro que João devia esperá-lo e recebe-lo na terra. Hão rever-se em Patmos. João reencontrará lá o divino Cordeiro de lado aberto: Agnum occisum ... quem pupugerunt.

Ó divina amizade, que merece contemplação e admiração eterna! (Leão Dehon, OSP 4, p. 591s.).



Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

« O Verbo fez carne, e nós vimos a sua glória» (Jo 1, 14).


Fonte http://www.dehonianos.org/

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Tempo do Natal - 2º dia da Oitava do Natal - 26.12.2014


 Lectio

 Primeira leitura: Actos 6, 8-10; 7, 54-60

 Naqueles dias, Estêvão, 8*Cheio de graça e força, fazia extraordinários milagres e prodígios entre o povo. 9*Ora, alguns membros da sinagoga, chamada dos libertos, dos cireneus, dos alexandrinos e dos da Cilícia e da Ásia, vieram para discutir com Estêvão; 10mas era-lhes impossível resistir à sabedoria e ao Espírito com que ele falava.

54Ao ouvirem tais palavras, encheram-se intimamente de raiva e rangeram os dentes contra Estêvão. 55Mas este, cheio do Espírito Santo e de olhos fixos no Céu, viu a glória de Deus e Jesus de pé, à direita de Deus. 56«Olhai, disse ele, eu vejo os Céus abertos e o Filho do Homem de pé, à direita de Deus.» 57Eles, então, soltaram um grande grito e taparam os ouvidos; depois, à uma, atiraram-se a ele 58*e, arrastando-o para fora da cidade, começaram a apedrejá-lo. As testemunhas depuseram as capas aos pés de um jovem chamado Saulo. 59*E, enquanto o apedrejavam, Estêvão orava, dizendo: «Senhor Jesus, recebe o meu espírito.» 60Depois, posto de joelhos, bradou com voz forte: «Senhor, não lhes atribuas este pecado.» Dito isto, adormeceu.

 Estêvão foi um dos primeiros sete diáconos da Igreja. Como os seus companheiros, estava ao serviço da comunidade cristã, para que a comunhão se tornasse visível também na distribuição dos bens (cf. Act 6, 1-6). Foi uma ardorosa testemunha de Cristo, dotado de particulares dons do Espírito, tais como a sabedoria contemplativa na pregação e a força evangélica na evangelização. O corajoso discurso que faz diante dos anciãos e chefes do povo, e a narração do seu martírio são um magnífico exemplo de catequese bíblica. O discurso termina com a profissão de fé em Jesus, feita por Estêvão. Os seus inimigos acusam-no de blasfemar e pecar contra a Lei e o templo, condenando-o à morte.

Ao narrar a lapidação de Estêvão, Lucas segue o esquema da narrativa da morte de Jesus. Como o seu Mestre, Estêvão morre confiando-se a Deus e perdoando aos seus algozes (cf. vv. 59-60; Lc 23, 34.46). Lucas mostra-nos, assim, que a vida de Cristo continua a na vida da Igreja: na disponibilidade ao Espírito, na pregação, na coerência evangélica e na própria morte.

Jesus, com a sua morte e ressurreição, e com o dom do Espírito, inaugurou um tempo novo. Ele é a plenitude da Lei, e não há perseguição capaz de O destruir.



 Evangelho: Mateus 10, 17-22

 Naquele tempo, Jesus disse aos discípulos: 17*Tende cuidado com os homens: hão-de entregar-vos aos tribunais e açoitar-vos nas suas sinagogas; 18sereis levados perante governadores e reis, por minha causa, para dar testemunho diante deles e dos pagãos. 19Mas, quando vos entregarem, não vos preocupeis nem como haveis de falar nem com o que haveis de dizer; nessa altura, vos será inspirado o que tiverdes de dizer. 20Não sereis vós a falar, mas o Espírito do vosso Pai é que falará por vós. 21O irmão entregará o seu irmão à morte, e o pai, o seu filho; os filhos hão-de erguer-se contra os pais e hão-de causar-lhes a morte. 22E vós sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas aquele que se mantiver firme até ao fim será salvo.

 Jesus dá alguns ensinamentos aos discípulos sobre as provações e sofrimentos que a Igreja há-de enfrentar ao longo dos tempos. Fá-lo com tanta clareza e abundância de

Caixa de texto: Tempo do Natal 26|Dezembro > Festa de Santo Estêvão
 pormenores que parece descrever a situação da Igreja depois do ano 70, quando teve de enfrentar diversas provações internas e externas. Corria o risco de desanimar e perder a fé no seu Senhor. Jesus toma medidas para a continuação da Sua obra no tempo e no espaço, antecipando acontecimentos e sinais que a comunidade cristã teria de enfrentar. Queria preparar os discípulos para ultrapassarem o escândalo da cruz.

Jesus procura animar os discípulos medrosos dizendo-lhe: «não vos preocupeis» (v. 19). O anúncio corajoso e alegre do Evangelho não pode ser feito por gente assustada e medrosa. Por isso, intervirá o Espírito Santo: «o Espírito do vosso Pai é que falará por vós» (v. 20).



 Meditatio

 Tempo de Natal. Ecoa aos nossos ouvidos, e nos nossos corações, a palavra de João: «O Verbo fez-Se carne e habitou entre nós». Estêvão estava plenamente certo desta verdade. Deus tinha inaugurado uma nova forma de estar presente no meio dos homens. Ele, Estêvão, e cada um dos discípulos, eram templos de Deus. O templo de Jerusalém já não era preciso. Jesus destrui-lo-ia. Os anciãos e chefes acusam-no de blasfémia e sacrilégio. Condenam-no à lapidação e executam a condenação. Há uma impressionante ligação entre o mistério da Encarnação que ontem celebrámos, e continuamos a celebrar em toda a oitava do Natal, e o martírio de Estêvão.

A morte de Estêvão, e a de tantas testemunhas da fé cristã, não será a última palavra sobre a vida destes discípulos de Jesus, porque Cristo é o Senhor da vida e da morte. A ressurreição de Jesus mostra a glória, como única realidade de verdadeira vida, para a qual todo o crente está encaminhado. Ela anuncia que a glória de Jesus, e a de todo o discípulo, passa pelo caminho do Calvário e pela morte na Cruz. A morte de Jesus, e a de Estêvão, oferecem um sinal que fala à nossa fé. O projecto de Deus é maior do que os projectos dos homens. O amor de Deus ultrapassa largamente todos os interesses de quem quer que seja. Somente Jesus, sinal do amor de Deus pelos homens, é capaz de libertar o homem da morte e de fazer brotar no coração do discípulo a fé como resposta radical à salvação oferecida por Deus.

Rezemos diante do presépio: «Senhor Jesus, recebe o meu espírito», para que vivamos como filhos do Pai e teus irmãos, dando testemunho da tua Encarnação, Morte e Ressurreição.

.

 Oratio

 Ó Bem-aventurado Santo Estêvão, valente soldado de Cristo, primeiro nas fileiras dos mártires; aceito alegremente que tu, ainda nesta terra, tenhas sido tão luminoso na santidade. Quando os teus inimigos se atiravam a ti, tu, de joelhos, rezavas: «Senhor, não lhes atribuas este pecado».

Homem feliz, quanta esperança nos dás, a nós teus amigos pecadores, quando nos damos contas que estás tão preocupado com pecadores arrogantes! Quanta bondade usarás para com os humildes, agora que foste exaltado, tu que assim socorrias os soberbos, quando eras humilhado! Que é que te queimava o coração, para assim derramares exteriormente tantas doçuras? Estavas certamente cheio de todas, ornado de todas, aceso por todas.

Eu te suplico, caridoso Estêvão, reza pela minha alma cheia de aridez, e enche-a de caridade generosa. Faz com que a minha alma insensível, por graça d´Aquele que a criou, seja incendiada pelo fogo da caridade. Amen. (oração inspirada num texto de Santo Anselmo de Aosta)







 Contemplatio

 Contemplo dois prisioneiros: O Menino Jesus em faixas e o seu primeiro mártir Santo Estêvão na prisão do Sinédrio: rapuerunt eum et adduxerunt in concilium (Actos 6, 12).



 Compreendo, divino Infante, que vos devo gratidão, amor, reparação, imitação: gratidão pelos vosso sofrimentos salutares, amor pelo vosso coração de menino totalmente entregue e generoso, reparação pela dureza de tantas almas que vos recebem sem amor. Quero, com o vosso santo mártir Estêvão, imitar a vossa paciência, a vossa mansidão, a vossa generosidade. (Leão Dehon, OSP 4, p. 591s.).



 Actio

Repete frequentemente e vive hoje a palavra:

«Senhor Jesus, recebe o meu espírito»


Fonte http://www.dehonianos.org/

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Natal do Senhor - Missa do Dia - Ano B - 25.12.2014


ANO B
NATAL DO SENHOR – MISSA DO DIA

Tema da "Missa do Dia"

A liturgia deste dia convida-nos a contemplar o amor de Deus, manifestado na incarnação de Jesus… Ele é a “Palavra” que se fez pessoa e veio habitar no meio de nós, a fim de nos oferecer a vida em plenitude e nos elevar à dignidade de “filhos de Deus”.
A primeira leitura anuncia a chegada do Deus libertador. Ele é o rei que traz a paz e a salvação, proporcionando ao seu Povo uma era de felicidade sem fim. O profeta convida, pois, a substituir a tristeza pela alegria, o desalento pela esperança.
A segunda leitura apresenta, em traços largos, o plano salvador de Deus. Insiste, sobretudo, que esse projecto alcança o seu ponto mais alto com o envio de Jesus, a “Palavra” de Deus que os homens devem escutar e acolher.
O Evangelho desenvolve o tema esboçado na segunda leitura e apresenta a “Palavra” viva de Deus, tornada pessoa em Jesus. Sugere que a missão do Filho/”Palavra” é completar a criação primeira, eliminando tudo aquilo que se opõe à vida e criando condições para que nasça o Homem Novo, o homem da vida em plenitude, o homem que vive uma relação filial com Deus.


LEITURA II – Is 52,7-10

Leitura do Livro de Isaías

Como são belos sobre os montes
os pés do mensageiro que anuncia a paz,
que traz a boa nova, que proclama a salvação
e diz a Sião: «O teu Deus é Rei».
Eis o grito das tuas sentinelas que levantam a voz.
Todas juntam soltam brados de alegria,
porque vêem com os próprios olhos
o Senhor que volta para Sião.
Rompei todas em brados de alegria, ruínas de Jerusalém,
porque o Senhor consola o seu povo,
resgata Jerusalém.
O Senhor descobre o seu santo braço à vista de todas as nações
e todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus.

AMBIENTE

Entre 586 e 539 a.C., o Povo de Deus experimenta a dura prova do Exílio na Babilónia. À frustração pela derrota e pela humilhação nacional, juntam-se as saudades de Jerusalém e o desespero por saber a cidade de Deus – orgulho de todo o israelita – reduzida a cinzas. Ao povo exilado, parece que Deus os abandonou definitivamente e que desistiu de Judá (alguns perguntam mesmo se Jahwéh será o Deus libertador – como anunciava a teologia de Israel – ou será um “bluff”, incapaz de proteger o seu Povo e de salvar Judá). Rodeado de inimigos, perdido numa terra estranha, ameaçado na sua identidade, sem perspectivas de futuro, com a fé abalada, Judá está desolado e abandonado e não vê saída para a sua triste situação. Quando, já na fase final do Exílio, as vitórias de Ciro, rei dos Persas, anunciam o fim da Babilónia, os exilados começam a ver uma pequenina luz ao fundo do túnel; mas, então, a libertação aparece-lhes como o resultado da acção de um rei estrangeiro e não como resultado da acção libertadora de Jahwéh… Ora, isso agrava mais ainda a crise de confiança em Jahwéh por parte dos exilados.
É neste contexto que aparece o testemunho profético do Deutero-Isaías. A sua mensagem (cf. Is 40-55) é uma mensagem de consolação e de esperança (os capítulos que recolhem a palavra do Deutero-Isaías são, precisamente, conhecidos como “Livro da Consolação”); diz que a libertação está próxima e é obra de Jahwéh.
O nosso texto está integrado na segunda parte do “Livro da Consolação” (cf. Is 40-55). Aí, o profeta (que na primeira parte – Is 40-48 – havia, sobretudo, anunciado a libertação do cativeiro e um “novo êxodo” do Povo de Deus, rumo à Terra Prometida) fala da reconstrução e da restauração de Jerusalém. O profeta garante que Deus não Se esqueceu da sua cidade em ruínas e vai voltar a fazer dela uma cidade bela e cheia de vida, como uma noiva em dia de casamento. É neste ambiente que podemos situar a primeira leitura de hoje.

MENSAGEM

Para revitalizar a esperança dos exilados, o profeta põe-nos a contemplar um quadro, fictício mas sugestivo quanto ao significado: à Jerusalém desolada e em ruínas, chega um mensageiro com uma “boa notícia”. Qual é essa “boa notícia” que o mensageiro traz? Ele anuncia “a paz” (“shalom”: paz, bem-estar, harmonia, felicidade), proclama a “salvação” e promete o “reinado de Deus”. A questão é, portanto, esta: Deus assume-Se como “rei” de Judá… Ele não reinará à maneira desses reis que conduziram o Povo por caminhos de egoísmo e de morte, de desgraça em desgraça até à catástrofe final do Exílio; mas Jahwéh exercerá a realeza de forma a proporcionar a “salvação” ao seu Povo – isto é, inaugurando uma era de paz, de bem-estar, de felicidade sem fim.
Num desenvolvimento muito bonito, o profeta/poeta põe as sentinelas da cidade (alertadas pelo anúncio do “mensageiro”) a olhar na direcção em que deve chegar o Senhor. De repente, soa o grito das sentinelas… Não é, no entanto, um grito de alarme, mas de alegria contagiante: elas vêem o próprio Jahwéh regressar ao encontro da sua cidade. Com Deus, Jerusalém voltará a ser uma cidade bela e harmoniosa, cheia de alegria e de festa. O profeta/poeta convida as próprias pedras da cidade em ruínas a cantar em coro, porque a libertação chegou. E a salvação que Deus oferece à sua cidade e ao seu Povo, será testemunhada por toda a terra, como se o mundo estivesse de olhos postos na acção vitoriosa de Deus em favor de Judá.

ACTUALIZAÇÃO

Para reflectir este texto, podemos servir-nos dos seguintes elementos:

• A alegria pela libertação do cativeiro da Babilónia e pela “salvação” que Deus oferece ao seu Povo anuncia essa outra libertação, plena e total, que Deus vai oferecer ao seu Povo através de Jesus. É isso que celebramos hoje: o nascimento de Jesus significa que a opressão terminou, que chegou a paz definitiva, que o “reinado de Deus” alcançou a nossa história. Para que essa “boa notícia” se cumpra é, no entanto, preciso acolher Jesus e aderir ao “Reino” que Ele veio propor.

• A alegria contagiante das sentinelas e os brados de contentamento das próprias pedras da cidade convidam-nos a acolher com alegria e em festa o Deus que veio libertar-nos… Se temos consciência da opressão que, dia a dia, nos rouba a vida e nos impede de ser livres e felizes, certamente sentiremos um grande contentamento ao deparar com essa proposta de liberdade que Jesus veio trazer. É essa alegria que nos anima, neste dia em que celebramos a chegada libertadora de Jesus?

• As sentinelas atentas que, nas montanhas em redor de Jerusalém, identificam a chegada do Deus libertador são um modelo para nós: convidam-nos a ler atentamente os sinais da presença libertadora de Deus no mundo e a anunciar a todos os homens que Deus aí está, para reinar sobre nós e para nos dar a salvação e a paz. Somos sentinelas atentas que descobrem os sinais do Senhor nos caminhos da história e anunciam o seu “reinado”, ou somos sentinelas negligentes que não vigiam nem alertam e que fazem com que o Deus libertador seja acolhido com indiferença pelo povo da “cidade”?


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 97 (98)

Refrão: Todos os confins da terra
viram a salvação do nosso Deus.

Cantai ao Senhor um cântico novo
pelas maravilhas que Ele operou.
A sua mão e o seu santo braço
Lhe deram a vitória.

O Senhor deu a conhecer a salvação,
revelou aos olhos das nações a sua justiça.
Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
em favor da casa de Israel.

Os confins da terra puderam ver
a salvação do nosso Deus.
Aclamai o Senhor, terra inteira,
exultai de alegria e cantai.

Cantai ao Senhor ao som da cítara,
ao som da cítara e da lira;
ao som da tuba e da trombeta,
aclamai o Senhor, nosso Rei.


LEITURA II – Heb 1,1-6

Leitura da Epístola aos Hebreus

Muitas vezes e de muitos modos
falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas.
Nestes dias, que são os últimos,
falou-nos por seu Filho,
a quem fez herdeiro de todas as coisas
e pelo qual também criou o universo.
Sendo o Filho esplendor da sua glória
e imagem da sua substância,
tudo sustenta com a sua palavra poderosa.
Depois de ter realizado a purificação dos pecados,
sentou-Se à direita da Majestade no alto dos Céus
e ficou tanto acima dos Anjos
quanto mais sublime que o deles
é o nome que recebeu em herança.
A qual dos Anjos, com efeito, disse Deus alguma vez:
«Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei»?
E ainda: «Eu serei para Ele um Pai
e Ele será para Mim um Filho»?
E de novo,
quando introduziu no mundo o seu primogénito, disse:
«Adorem-n’O todos os Anjos de Deus».

AMBIENTE

A Carta aos Hebreus é um escrito de autor anónimo e cujos destinatários, em concreto, desconhecemos (o título “aos hebreus” provém das múltiplas referências ao Antigo Testamento e ao ritual dos “sacrifícios” que a obra apresenta). É possível que se dirija a uma comunidade cristã constituída maioritariamente por cristãos vindos do judaísmo; mas nem isso é totalmente seguro, uma vez que o Antigo Testamento era um património comum, assumido por todos os cristãos – quer os vindos do judaísmo, quer os vindos do paganismo. Trata-se, em qualquer caso, de cristãos em situação difícil, expostos a perseguições e que vivem num ambiente hostil à fé… São também cristãos que facilmente se deixam vencer pelo desalento, que perderam o fervor inicial e que cedem às seduções de doutrinas não muito coerentes com a fé recebida dos apóstolos… O objectivo do autor é estimular a vivência do compromisso cristão e levar os crentes a crescer na fé. Para isso, expõe o mistério de Cristo (apresentado, sobretudo, como “o sacerdote” da Nova Aliança) e recorda a fé tradicional da Igreja.
O texto que nos é hoje proposto pertence ao prólogo do sermão. Nesse prólogo, o pregador apresenta a visão global e as coordenadas fundamentais que ele vai, depois, desenvolver ao longo da obra.

MENSAGEM

Temos aqui esboçadas, em traços largos, as coordenadas fundamentais da história da salvação. Deus é o protagonista principal dessa história…
O texto alude ao projecto salvador de Deus. Esse projecto manifestou-se, numa primeira fase, através dos porta-vozes de Deus – os profetas; eles transmitiram aos homens a proposta salvadora e libertadora de Deus.
Veio, depois, uma segunda etapa da história da salvação: “nestes dias que são os últimos”, Deus manifestou-se através do próprio “Filho” – Jesus Cristo, o “menino de Belém”, a Palavra plena, definitiva, perfeita, através da qual Deus vem ao nosso encontro para nos “dizer” o caminho da salvação e da vida nova. O nosso texto reflecte então – sem contudo desenvolver uma lógica muito ordenada – sobre a relação de Jesus com o Pai, com os homens e com os anjos (o que nos situa no ambiente de uma comunidade que dava importância excessiva ao culto dos “anjos” e que lhes concedia um papel preponderante na salvação do homem).
Como é que se define a relação de Jesus com o Pai? Para o autor da Carta aos Hebreus, Jesus, o “Filho”, identifica-Se plenamente com o Pai. Ele é o esplendor da glória do Pai, a imagem do ser do Pai, a reprodução exacta e perfeita da substância do Pai: desta forma, o autor da carta afirma que Jesus procede do Pai e é igual ao Pai. N’Ele manifesta-Se o Pai; quem olha para Ele, encontra o Pai.
Definida a relação de Jesus com Deus, o autor reflecte sobre a relação de Jesus com o mundo… O Filho está na origem do universo (e, portanto, também do homem); por isso, Ele tem um senhorio pleno sobre toda a criação. Essa soberania expressa-se, inclusive, na incarnação e redenção: Ele veio ao encontro do homem e purificou-o do pecado: dessa forma, Ele completou a obra começada pela Palavra criadora, no início. É como “o Senhor” – que possui soberania sobre os homens e sobre o mundo, que cria e que salva – que os homens O devem ver e acolher.
A igualdade fundamental do “Filho” com o Pai fá-lo muito superior aos anjos: os anjos não são “filhos”; mas Jesus é “o Filho”e o próprio Deus proclamou essa relação de filiação plena, real, perfeita. Não são os anjos que salvam, mas sim “o Filho”.
Sendo a Palavra última e definitiva de Deus, Ele deve ser escutado pelos homens como o caminho mais seguro para chegar a essa vida nova que o Pai nos quer propor. É tendo consciência desse facto que devemos acolher o “menino de Belém”.

ACTUALIZAÇÃO

Na reflexão, convém dar atenção aos seguintes dados:

• Celebrar o nascimento de Jesus é, em primeiro lugar, contemplar o amor de um Deus que nunca abandonou os homens à sua sorte; por isso, rompeu as distâncias, encontrou forma de dialogar com o homem e enviou o próprio Filho para conduzir o homem ao encontro da vida definitiva, da salvação plena. No dia de Natal, nunca será demais insistir nisto: o Deus em quem acreditamos é o Deus do amor e da relação, que continua a nascer no mundo, a apostar nos homens, a querer dialogar com eles, e que não desiste de propor aos homens – apesar da indiferença com que as suas propostas são, às vezes, acolhidas – um caminho para chegar à felicidade plena.

• Jesus Cristo é a Palavra viva e definitiva de Deus, que revela aos homens o verdadeiro caminho para chegar à salvação. Celebrar o seu nascimento é acolher essa Palavra viva de Deus… “Escutar” essa Palavra é acolher o projecto que Jesus veio apresentar e fazer dele a nossa referência, o critério fundamental que orienta as nossas atitudes e as nossas opções. A Palavra viva de Deus (Jesus) é, de facto, a nossa referência? O que Ele diz orienta e condiciona as minhas atitudes, os meus valores, as minhas tomadas de posição? Os valores do Evangelho são os meus valores? Vejo no Evangelho de Jesus a Palavra viva de Deus, a Palavra plena e definitiva através da qual Deus me diz como chegar à salvação, à vida definitiva?


ALELUIA – Jo 1,1-18

Aleluia. Aleluia.

Santo é o dia que nos trouxe a luz.
Vinde adorar o Senhor.
Hoje, uma grande luz desceu sobre a terra.


EVANGELHO – Jo 1,1-18

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João

No princípio era o Verbo
e o Verbo estava com Deus
e o Verbo era Deus.
No princípio, Ele estava com Deus.
Tudo se fez por meio d’Ele
e sem Ele nada foi feito.
N’Ele estava a vida
e a vida era a luz dos homens.
A luz brilha nas trevas
e as trevas não a receberam.
Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João.
Veio como testemunha,
para dar testemunho da luz,
a fim de que todos acreditassem por meio dele.
Ele não era a luz,
mas veio para dar testemunho da luz.
O Verbo era a luz verdadeira,
que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem.
Estava no mundo
e o mundo, que foi feito por Ele, não O conheceu.
Veio para o que era seu
e os seus não O receberam.
Mas, àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome,
deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus.
Estes não nasceram do sangue,
nem da vontade da carne, nem da vontade do homem,
mas de Deus.
E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós.
Nós vimos a sua glória,
glória que Lhe vem do Pai como Filho Unigénito,
cheio de graça e de verdade.
João dá testemunho d’Ele, exclamando:
«Era deste que eu dizia:
‘O que vem depois de mim passou à minha frente,
porque existia antes de mim’».
Na verdade, foi da sua plenitude que todos nós recebemos
graça sobre graça.
Porque, se a Lei foi dada por meio de Moisés,
a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo.
A Deus, nunca ninguém O viu.
O Filho Unigénito, que está no seio do Pai,
é que O deu a conhecer.

AMBIENTE

A Igreja primitiva recorreu, com frequência, a hinos para celebrar, expressar e anunciar a sua fé. O prólogo ao Evangelho segundo João (que hoje nos é proposto) é um desses hinos.
Não é certo se este hino foi composto por João, ou se o autor do Quarto Evangelho usou um primitivo hino cristão conhecido da comunidade joânica, adaptando-o de forma a que ele servisse de prólogo à sua obra. O que é certo é que o hino cristológico que chegou até nós expressa, em forma de confissão, a fé da comunidade joânica em Cristo enquanto Palavra viva de Deus, a sua origem eterna, a sua procedência divina, a sua influência no mundo e na história, possibilitando aos homens que O acolhem e escutam tornarem-se “filhos de Deus”. Essas grandes linhas, enunciadas neste prólogo, vão depois ser desenvolvidas pelo evangelista ao longo da sua obra.

MENSAGEM

O prólogo ao Quarto Evangelho começa com a expressão “no princípio”: dessa forma, João enlaça o seu Evangelho com o relato da criação (cf. Gn 1,1), oferecendo-nos assim, desde logo, uma chave de interpretação para o seu escrito… Aquilo que ele vai narrar sobre Jesus está em relação com a obra criadora de Deus: em Jesus vai acontecer a definitiva intervenção criadora de Deus no sentido de dar vida ao homem e ao mundo… A actividade de Jesus, enviado do Pai, consiste em fazer nascer um homem novo; a sua acção coroa a obra criadora iniciada por Deus “no princípio”.
João apresenta, logo a seguir, a “Palavra” (“Lógos”). A “Palavra” é – de acordo com o autor do Quarto Evangelho – uma realidade anterior ao céu e à terra, implicada já na primeira criação. Esta “Palavra” apresenta-se com as características que o “Livro dos Provérbios” atribuía à “sabedoria”: pré-existência (cf. Prov 8,22-24) e colaboração com Deus na obra da criação (cf. Prov 8,24-30). No entanto, essa “Palavra” não só estava junto de Deus e colaborava com Deus, mas “era Deus”. Identifica-se totalmente com Deus, com o ser de Deus, com a obra criadora de Deus. É como que o projecto íntimo de Deus, que se expressa e se comunica como “Palavra”. Deus faz-Se inteligível através da “Palavra”. Essa “Palavra” é geradora de vida para o homem e para o mundo, concretizando o projecto de Deus.
Essa “Palavra” veio ao encontro dos homens e fez-se “carne” (pessoa). João identifica claramente a “Palavra” com Jesus, o “Filho único cheio de amor e de verdade”, que veio ao encontro do homem. Nessa pessoa (Jesus), podemos contemplar o projecto ideal de homem, o homem que nos é proposto como modelo, a meta final da criação de Deus.
Essa “Palavra” “montou a sua tenda no meio de nós”. O verbo “skênéô” (“montar a tenda”) aqui utilizado alude à “tenda do encontro” que, na caminhada pelo deserto, os israelitas montavam no meio ou ao lado do acampamento e que era o local onde Deus residia no meio do seu Povo (cf. Ex 27,21; 28,43; 29,4…). Agora, a “tenda de Deus”, o local onde Ele habita no meio dos homens é o Homem/Jesus. Quem quiser encontrar Deus e receber d’Ele vida em plenitude (“salvação”), é para Jesus que se tem de voltar.
A função dessa “Palavra” está ligada ao binómio “vida/luz”: comunicar ao homem a vida em plenitude; ou, por outras palavras, trata-se de acender a luz que ilumina o caminho do homem, possibilitando-lhe encontrar a vida verdadeira, a vida plena.
Jesus Cristo vai, no entanto, deparar-Se com a oposição à “vida/luz” que Ele traz. Ao longo do Evangelho, João irá contando essa história do confronto da “vida/luz” com o sistema injusto e opressor que pretende manter os homens prisioneiros do egoísmo e do pecado (e que João identifica com a Lei. Os dirigentes judeus que enfrentam Jesus e o condenam à morte são o rosto visível dessa Lei). Recusar a “vida/luz” significa preferir continuar a caminhar nas trevas (que se identificam com a mentira, a escravidão, a opressão), independentemente de Deus; significa recusar chegar a ser homem pleno, livre, criação acabada e elevada à sua máxima potencialidade.
Mas o acolhimento da “Palavra” implica a participação na vida de Deus. João diz mesmo que acolher a “Palavra” significa tornar-se “filho de Deus”. Começa, para quem acolhe a “Palavra”/Jesus, uma nova relação entre o homem e Deus, aqui expressa em termos de filiação: Deus dá vida em plenitude ao homem, oferecendo-lhe, assim, uma qualidade de vida que potencia o seu ser e lhe permite crescer até à dimensão do homem novo, do homem acabado e perfeito. Isto é uma “nova criação”, um novo nascimento, que não provém da carne e do sangue, mas sim de Deus.
A incarnação de Jesus significa, portanto, que Deus oferece à humanidade a vida em plenitude. Sempre existiu no homem o anseio da vida plena, conforme o projecto original de Deus; mas, na prática, esse anseio fica, muitas vezes, frustrado pelo domínio que o egoísmo, a injustiça, a mentira (o pecado) exercem sobre o homem. Toda a obra de Jesus consistirá em capacitar o homem para a vida nova, para a vida plena, a fim de que ele possa realizar em si mesmo o projecto de Deus: a semelhança com o Pai.

ACTUALIZAÇÃO

Na reflexão, considerar as seguintes linhas:

• A transformação da “Palavra” em “carne” (em menino do presépio de Belém) é a espantosa aventura de um Deus que ama até ao inimaginável e que, por amor, aceita revestir-Se da nossa fragilidade, a fim de nos dar vida em plenitude. Neste dia, somos convidados a contemplar, numa atitude de serena adoração, esse incrível passo de Deus, expressão extrema de um amor sem limites.

• Acolher a “Palavra” é deixar que Jesus nos transforme, nos dê a vida plena, a fim de nos tornarmos, verdadeiramente, “filhos de Deus”. O presépio que hoje contemplamos é apenas um quadro bonito e terno, ou uma interpelação a acolher a “Palavra”, de forma a crescermos até à dimensão do homem novo?

• Hoje, como ontem, a “Palavra” continua a confrontar-se com os sistemas geradores de morte e a procurar eliminar, na origem, tudo o que rouba a vida e a felicidade do homem. Sensíveis à “Palavra”, embarcados na mesma aventura de Jesus – a “Palavra” viva de Deus – como nos situamos diante de tudo aquilo que rouba a vida do homem? Podemos pactuar com a mentira, o oportunismo, a violência, a exploração dos pobres, a miséria, as limitações aos direitos e à dignidade do homem?

• Jesus (esse menino do presépio) é para nós a “Palavra” suprema que dá sentido à nossa vida, ou deixamos que outras “palavras” nos condicionem e nos induzam a procurar a felicidade em caminhos de egoísmo, de alienação, de comodismo, de pecado? Quais são essas “palavras” que às vezes nos seduzem e nos afastam da “Palavra” eterna de Deus que ecoa no Evangelho que Jesus veio propor?


ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O DIA DE NATAL
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)

1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior ao Dia de Natal, procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno a Palavra de Deus.

2. PALAVRA DE VIDA.
É na noite que é belo acreditar na luz… Era a noite para este casal em viagem e, para mais, no momento em que a mulher devia dar à luz. Nunca há lugar para aqueles que incomodam. É então, na obscuridade de um estábulo, que a luz aparece para iluminar não somente este lugar bem sombrio, mas o mundo inteiro tantas vezes tão mergulhado na noite da dúvida e da violência. Era a noite para estes pastores em cuja palavra havia tanta dificuldade em acreditar, por estar muitas vezes longe da verdade. Ora, é a eles que a boa nova é anunciada para que ela não cesse de seguida de se transmitir de geração em geração. Uma luz rasga então a noite da Judeia, é a luz da glória do Senhor e o anúncio da paz sobre a terra aos homens que Deus ama. Não espanta que esta criança acabada de nascer proclame mais tarde: «Eu sou a luz do mundo». Esperar é levantar os olhos quando ainda é noite, para descobrir a luz mais forte que a noite.

3. UM PONTO DE ATENÇÃO.
Valorizar o Glória a Deus. Pôr em realce o hino de Natal, o Glória a Deus, tomando tempo para cantá-lo com uma melodia que seja bem conhecida da assembleia. Outros elementos poderão intervir para dar à celebração um ar de festa: por exemplo, um acolhimento mais caloroso que o habitual, uma bonita decoração floral, a iluminação do presépio, um gesto de paz afectuoso, intenções de oração plenas de esperança, uma oração de louvor mais desenvolvida, etc. Esta pode ser feita quando os fiéis estiverem reagrupados à volta do presépio. Convém ter em atenção que, na missa da manhã de Natal, muitos não participaram na missa da noite. É, pois, a celebração do nascimento de Jesus que os reúne. Pode-se escolher, entre todos os textos que as três missas de Natal propõem, aqueles que são mais acessíveis e evocadores. Por exemplo, o Evangelho da noite, completado com o da aurora, pode convir mais que o Evangelho do dia.

4. PARA A SEMANA QUE SE SEGUE…
A presença de Deus diz-se e mostra-se. A presença de Deus mostra-se através de sinais de tolerância, de acolhimento, de partilha, que podemos facilmente ter à nossa volta. A presença de Deus fala através da ternura para com os mais pobres, os excluídos, os doentes, todos os que sofrem, as pessoas sós, em particular nestes dias de festa. A presença de Deus traduzir-se-á ainda através de toda a solicitude concedida gratuitamente àqueles que procuram, que duvidam, que têm necessidade de ser acompanhados na sua procura. A presença de Deus exprimir-se-á muitas vezes através do humilde testemunho da nossa vida habitada pelo seu amor: se Ele me enche com a sua alegria, se Ele me faz viver, se Ele me leva a ajudar os outros, é porque Ele está bem vivo!


UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel. 218540900 – Fax: 218540909
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